Não basta a explicação científica; é preciso considerar atentamente a eticidade das técnicas empregadas
O interesse das pessoas pelas questões da bioética tem sido cada vez maior. Elas já começam a fazer parte do cotidiano das pessoas, veiculadas pela imprensa, redes sociais ou em roda de amigos. Dentre elas, estão temas antigos como aborto e pena de morte ou novas questões como fecundação artificial, clonagem, células tronco, transplante de órgãos e eutanásia.
O campo da bioética abarca questões complexas e controvertidas relativas à vida, desde a vida nascente até a vida em estado terminal, incluindo a abordagem ética das pesquisas científicas. Diversos problemas dos quais se ocupa a bioética são ainda recentes, difíceis de serem explicados pelas próprias ciências e, por isso, difíceis de serem avaliados sob o ponto de vista ético. É necessário conhecer bem os problemas para não cair no ‘achismo’, atitude simplista que impede um discernimento ético justo. É bom que as questões de bioética sejam divulgadas pela mídia e é bastante positivo o interesse das pessoas em conhecê-las. Contudo, é preocupante o modo superficial como são tratados, muitas vezes, os temas de bioética, revelando desconhecimento da realidade e falta de critérios de discernimento. Para uma postura correta, dois aspectos são fundamentais, especialmente no âmbito das biotecnologias.
Conhecimento
O primeiro é conhecer, o melhor possível, a realidade objetiva em questão, considerando atentamente a contribuição das ciências para a sua devida compreensão. As técnicas científicas têm implicações éticas; por isso, é preciso conhecê-las bem. Nem tudo o que é tecnicamente possível é eticamente aceitável. A valorização da ciência não implica na aceitação do cientificismo. A postura cientificista de endeusamento e absolutização da ciência tem sido questionada, inclusive no campo da epistemologia científica, cedendo lugar a uma postura mais crítica e dinâmica do conhecimento. Por outro lado, não se pode “a priori” negar a validade do conhecimento científico.
O segundo aspecto necessário para uma justa consideração das questões de bioética refere-se aos critérios éticos. Não basta a explicação científica; é preciso considerar atentamente a eticidade das técnicas empregadas. Trazem graves consequências para a humanidade a postura de exclusão da ética ou o relativismo ético.
Num mundo marcado por tantas ameaças e violações à vida, é preciso valorizar o saber científico e, ao mesmo tempo, afirmar com vigor o direito inviolável à vida e a comum dignidade das pessoas. Não se pode fazer abatimentos, negando ou atribuindo de forma desigual o direito à vida e à dignidade humana, ao abordar questões de bioética. Menor qualidade de vida ou menos condições de vida, por motivo de saúde ou vulnerabilidade social, não implica em menor dignidade ou menos direito de viver. Estudando bem as questões de bioética pode-se defender e promover a vida, dom do Criador, com maior competência e eficácia.
Cardeal Dom Sergio da Rocha
Arcebispo de São Salvador da Bahia, Primaz do Brasil