Meditações da Via-sacra

11ª Estação – Jesus é pregado na cruz

 “Ali o crucificaram” (Lc 23,33)

Três, dizem ter sido, os cravos que perfuraram as mãos e os pés do Senhor, crucificaram Seu Corpo Santo no Madeiro de dor. Por que ferir assim quem somente amou? Cravos? Objetos pontiagudos feitos de um metal duro como o ferro… “ah quanto tempo faz, quando lhes fiz descobrir os metais, para fazerem a enxada, a pá, o arado e da terra o alimento tirar, ou até mesmo cravos para que presas suas tendas no chão do deserto suas vidas lhes pudesse guardar, mas, depois de um tempo, fizeram armas que faziam o outro sangrar e até agora ousam Meu Filho na cruz Crucificar…” 

Quem sabe se não foi assim que, naquele momento, pensava o Pai quando três cravos de ferro perfuravam Jesus? Esses cravos parecem ter nomes…

PRIMEIRO CRAVO: DESAMOR

O primeiro se chama “desamor”, porque se grande era a dor do cravo de metal perfurando sua carne inocente, dor ainda maior era a do desamor que sentia vindo do ser humano. Assim Santo Afonso de Ligório nos diz: “Cristo amou muito mais do que sofreu” 1, ou seja, seu sofrimento interior era bem mais doloroso que o exterior da carne, o cravo de ferro era, na verdade, apenas um pequeno sinal do que os cravos do desamor causavam naquele que é Amor; continua Santo Afonso:

“Ó amor divino, fostes maior do que exteriormente vos mostrastes. Mostrastes-vos grande exteriormente, porque tantas chagas e feridas nos falam de um grande amor. Mas não dizem toda sua grandeza. Interiormente, fostes maior do que exteriormente vos manifestastes: vossas dores físicas foram, apenas, uma faísca que saiu daquela grande fornalha de imenso amor.”2

É verdade… É preciso saber que se o cravo do calvário feriu apenas um instante, o cravo do desamor é ferida constante que o ser humano cotidianamente insiste em mais uma vez usar; não apenas quando não O ama como Ele é digno de ser amado, mas também quando não ama seu semelhante assim como Ele ensinou:

“Amai-vos uns aos outros como eu vos amei” (Jo 13,34)… 

“Ah Senhor Jesus, perdoa-nos por todas as vezes que ainda O crucificamos com os cravos do desamor, quando deixamos que o ódio, a vingança, a indiferença, o egoísmo, o materialismo, o ativismo, o falso sentido de urgência, a preguiça, a fofoca, a maledicência, a concupiscência, com toda espécie de falta de caridade e desobediência ao ‘amar a Deus sobre todas as coisas e o próximo como a si mesmo’ (cf. Mc 12,33) continuam ainda hoje a feri-lo e crucificar com essa brutal espécie de cravo, o cravo do desamor”.

SEGUNDO CRAVO: INJUSTIÇA

O segundo cravo se chama “injustiça”, o conceito básico de justiça é: Dar a cada um aquilo que lhe é de direito, portanto, a liberdade não dada a Jesus, o Inocente galileu, é uma injustiça! Eis o que contemplamos no Gólgota a total ausência de justiça, onde culpados estão soltos e o “Inocente” condenado… O profeta Isaías diz: “Mas estava sendo transpassado por causa dos nossos crimes, estava sendo esmagado por nossos pecados. O castigo que teríamos que pagar estava sobre Ele” (Is 53,5); portanto, quem deveria mesmo estar ali sendo transpassado pelos cravos (e depois pela lança)?

Eu, você e todos os pecadores que já existiram e os que ainda virão, foi por mim, foi por você que Ele aceitou ser injustiçado! Ó imensa contradição! Quem estaria disposto a aceitar, como Ele ser injustiçado? Comumente ninguém aceita uma injustiça, não é verdade? Quem nunca ouviu na vida alguém indignado com alguma situação e de repente vem aquele grito: “Mas isso é uma injustiça!” Dói mesmo! E Ele sabe o que é sentir essa dor, Ele sabe muito bem como é sentir-se injustiçado, foi humilhante, mas o que Ele fez?

Assim está escrito: “Oprimido, Ele se rebaixou, nem abriu a boca” (Is 53,7); alguém pode perguntar: “Como assim Ele não  falou nada? Ficou em silêncio? Não lutou pelos seus direitos?” “Não”, a resposta é “não”, Ele não lutou pelos seus direitos, ele aceitou que entrasse no mais profundo da sua carne e espiritualmente em sua alma o cravo da injustiça, e por quê? Para que eu e você, os injustos e culpados na história, nos tornássemos através dele, justos e inocentados na glória, Ele não lutou pelos seus direitos para conquistar os nossos…

Foto: Cathopic- @tachodimas

Como não amar alguém assim? Como não ser grato por tudo isso? Tudo por amor, por você e por mim, e lembra do “ninguém te condenou? Eu também não te condeno”(Jo 8,11)? Ela era inocente? Não, não é? Mas foi inocentada, e não é a mesma coisa que acontece e se atualiza todas as vezes que confessamos nossos pecados como culpados e saímos inocentados do Tribunal da Misericórdia no Sacramento da Confissão?

Agora, perguntemos para nós mesmos: Quem foi perdoado dessa maneira, ainda acha justo não perdoar o próximo? A Misericórdia pôs em crise o conceito humano de justiça… Não percebemos ainda que todas as vezes que não perdoamos, repetimos os golpes dos algozes de Cristo no Calvário usando os nossos cravos da injustiça na carne e/ou na alma do próximo e naquele que disse: “Pai perdoa-lhes, eles não sabem o que fazem” (Lc 23,34)?.

“Ah, Senhor Jesus, tende piedade de nós, somos ainda tão injustos e cegos, nos achamos justos, equilibrados, quando, na verdade, na maioria das vezes, estamos bem longe disso. Há tantos, Senhor, que não percebem a injustiça do matar crianças inocentes ainda no ventre, há ainda Jesus tanta corrupção dentro de nós que hoje em dia há quem roube, minta, mate, engane, adultere, e ensine que o errado é certo e o certo errado (cf Is 5,20), e acham que ‘está tudo bem’, quanta injustiça em nós, Senhor, mas transforma-nos pela força do Teu Espírito, arranca esse coração de pedra e dá-nos um coração de carne, um coração novo (cf. Ez 36,26), semelhante ao Teu para não mais te ferir nem ferir o próximo com os cravos da injustiça”.

TERCEIRO CRAVO: INCOMPREENSÃO

O terceiro cravo se chama “incompreensão”, a incompreensão mata, e mata muito mais do que se imagina. Se eles compreendessem quem era Jesus, tudo seria bem diferente; Ele mesmo, um dia, chorando, disse: “Oh! Se tu também compreendesses hoje o que te pode trazer a paz!” (Lc 19,42).

“Não, Jesus crucificado pelo cravo da incompreensão, eles não compreenderam quem eras Tu, eles não reconheceram aquele que lhes podia trazer a paz, pelo contrário temeram o desconhecido, o diferente, o “Sinal de contradição” (Lc 2,34).

Quantos e quantos ainda hoje continuam a te crucificar com esse mesmo cravo? Por falta da verdadeira compreensão sobre Ti e aquilo que vem de Ti, equivocadamente dizem “Deus não existe” ou “Jesus era somente um homem”, ou “eu não preciso de igreja não”, outra vezes Jesus é a incompreensão sobre quem são e o seu valor, então buscam nos lugares, nas coisas ou nas pessoas a felicidade que só Tu és capaz de dar, e depois, frustrados, adoecem e vão morrendo aos poucos, e alguns até tentam se suicidar, simplesmente porque ainda não compreenderam bem quem são e quem és, há ainda os que veem no próximo um inimigo ou um ser inferior por causa da cor, da raça, do sexo, do local de nascimento e até da religião…

É Jesus… Ainda hoje há muita gente crucificando-Te, crucificando-se e crucificando o próximo por falta de compreensão. Tende misericórdia e fazei-nos compreender mais claramente quem Tu és, quem somos e quem é o próximo, para que o poder da verdade do Teu amor dissipe todas as mentiras, confusões e incompreensões diabólicas provocadas pela Antiga Serpente, a mesma que a primeira Eva enganou, mas que, com o auxílio da sabedoria da Segunda Eva, a Virgem Maria, que tudo compreendeu pelo Espírito que sobre ela desceu (cf. Lc 1,35), que Ele também desça sobre toda a humanidade para que a seguindo como modelo, mãe e intercessora, abandonemos definitivamente as armas do cravo da incompreensão.”

 

 

 

 

. 1 Práticas de amor a Jesus Cristo, Editora Santuário [versão digital Ebook]

. 2 Iden

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