Solenidade do Corpo e do Sangue de Cristo: um dia de amor e reparação
Todos os anos, na Quinta-Feira depois do Domingo da Santíssima Trindade, a Igreja celebra a Solenidade do Corpo e Sangue de Cristo. Trata-se de uma Liturgia por meio da qual a Igreja manifesta o seu amor ao Mistério da Presença Real de Jesus Cristo no Santíssimo Sacramento e faz reparação por tudo aquilo que desrespeita essa tão sublime presença. Neste dia, os cristãos católicos prestam sua adoração a Cristo, reconhecendo no Pão e no Vinho consagrados o Seu Corpo, o Seu Sangue, a Sua Alma e Divindade.
Se pensarmos bem, a Liturgia da Igreja já possui um momento de profundo apelo Eucarístico: a Celebração da Ceia do Senhor, e, por consequência, todo o Tríduo Pascal. Entretanto, por causa da “densidade teológica e espiritual” dos dias da Páscoa, não se pode realçar com mais tempo algumas das nuances do Mistério de Cristo na Eucaristia, pois isso poderia ofuscar outras nuances igualmente importantes. Deste modo, o “todo” da Páscoa poderia ficar prejudicado. O Espírito cuidou, em Sua providência, que, ao longo da história, se pudesse encontrar ocasião de prestar especial adoração ao Santíssimo Sacramento, um ato devocional que se tornou “fonte inesgotável de santidade”¹.
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.:Origem da festa de Corpus Christi
A liturgia de Corpus Christi tem uma história que demonstra, ao mesmo tempo, o perigo do erro e do desvio da fé, bem como o amor e a defesa da verdadeira Doutrina. No século XI, havia entre os mestres da escola adjacente à Catedral de Chartres, na França, um estudioso chamado Berengário, nascido em Tours. Homem de uma grandiosa erudição, Berengário dedicou-se ao estudo da Lógica e da Teologia. Ao expor suas teses sobre a Eucaristia, ele acabou por negar a presença real de Jesus neste Santíssimo Sacramento. Isso se configurou como uma heresia, ou seja, um desvio daquilo que tradicionalmente era pregado pela Doutrina Cristã. Do ponto de vista teológico, muitos estudiosos se dedicaram a refutar os seus textos. Mas a refutação teológica não foi a única resposta a este desvio de fé. Também na oração do povo foi surgindo uma crescente devoção reparadora. A isso se somem algumas experiências místicas bonitas em torno da Eucaristia, tanto na Bélgica como em Bolsena na Itália, onde ocorreu um Milagre Eucarístico. O Papa Urbano IV (1262-1264) pediu que se levasse a relíquia de tal Milagre, de Bolsena a Orvieto. E isso foi feito em procissão. Para oficializar esse costume, o mesmo Papa, em 11 de agosto de 1264, publicou a bula Transiturus de Mundo, pela qual se mandava celebrar em todo o orbe católico a Solenidade de Corpus Christi, na quinta-feira após a “oitava de Pentecostes”, oitava esta extinta após a reforma litúrgica.
Embora já não estejamos mais no período medieval, no qual surgiu esta Festa, urge ainda em nossa época reconhecer a presença sacramental de Jesus na Eucaristia. O dia de Corpus Christi ainda deseja “remediar” as faltas cometidas contra este sacramento, a começar pelas mais explícitas, como os atos sacrílegos. A reparação eucarística se presta a sanar também faltas menos explícitas, mas nem por isso sem gravidade. Essa data quer chamar a atenção dos fiéis, dos estudiosos e daqueles que são responsáveis pela propagação da fé, para as ideias teológicas que aqui e ali surgem, em meios eclesiais, e que divergem da Doutrina Católica a respeito da Eucaristia. Tem ainda o intuito de despertar para as consequências sociais da participação no Sacramento da Comunhão. Afinal, aquele que diz “Amém”, diante do Corpo do Senhor, deve lembrar-se de partilhar o próprio pão de cada dia, para que ele falte menos à mesa dos irmãos mais carentes.
Por fim, sendo a Eucaristia “fonte e centro de toda a vida crist㔲, ela edifica a Igreja. Na Última Ceia, ao dar à Comunidade Apostólica o Sacramento da Nova e Eterna Aliança, Cristo dava com ele a capacidade de a Igreja manter-se unida. De fato, “pela comunhão eucarística, a Igreja é consolidada na sua unidade de corpo de Cristo”³. Por causa disso, Corpus Christi é também a Festa da Unidade. Por isso, festejemos o Corpo e o Sangue do Senhor, que é nosso grandioso tesouro. Participemos, adoremos, reparemos. Tenhamos atenção aos mais simples, tenhamos fé madura e comprometida com a Igreja. Que a virtude da fé venha como suplemento, completar aquilo que os nossos sentidos são capazes de captar, para nos fazer entrever no Pão e no Vinho consagrados Àquele que veremos face a face nos céus (cf. 1Cor 13,12). Feliz celebração a todos!
Padre Eduardo Nunes Pugliesi, scj
Paróquia Sagrado Coração de Jesus – Rio de Janeiro (RJ)
1 Ecclesia de Eucharistia 10.
2 Lumen gentium 11.
3 Ecclesia de Eucharistia 23.