O Evangelho de São Marcos termina com ordem de Jesus que mudou o mundo: “Ide por todo o mundo, proclamando o Evangelho a toda a humanidade. Quem crer e for batizado se salvará; quem não crer, se condenará” (Marcos 16, 15-16). No último versículo do Evangelho, Marcos faz questão de deixar claro que os apóstolos obedeceram ao mandamento do Senhor: “Eles saíram para pregar por todos os lugares, e o Senhor cooperava e confirmava a mensagem com os sinais que a acompanhavam” (Marcos 16, 20). De lá para cá, incontáveis crentes dedicaram as suas vidas para seguir essa ordem do Senhor, a começar pelos próprios apóstolos, que, com exceção de São João, pagaram com a vida pela ousadia de anunciar a Boa Nova. Ao longo dos mais de dois mil anos de história da Igreja, pessoas aprenderam novos idiomas, estudaram novas culturas, aventuraram-se em terras estrangeiras, enfrentaram frio e fome, ameaças e privação, prisão e torturas, tudo para que o Evangelho não deixasse de ser anunciado: “Ai de mim se eu não pregar o Evangelho”, disse São Paulo, o Apóstolo dos Gentios, que foi o precursor dessa evangelização que não encontra barreiras, não vê limites. Por isso ele, sendo livre, se fez escravo, fez-se judeu com os judeus, fez-se sem lei para juntar-se aos que não tinham lei, fez-se fraco com os fracos, enfim, fez-se tudo para todos, para salvar alguns. “E tudo faço pela boa notícia, para participar dela” (I Coríntios 9, 23), arremata.
Saltando alguns séculos para a frente, lembramos de alguém que viveu bem essa dimensão do risco apostólico: São José de Anchieta, o “apóstolo do Brasil”. Enviado à distante, inóspita e recém-descoberta Terra de Santa Cruz, tomou um barco, assim como o profeta Jonas, mas para chegar ao seu destino, não para fugir dele. Aqui, Anchieta e seus companheiros partiram a semear o Evangelho, mas houve, nas palavras do próprio santo, “trigo mirrado, trigo afogado, trigo comido e trigo pisado”. Houve missionários afogados, missionários que se perderam na selva e morreram de fome e de doença e até missionários devorados por canibais.
Lamenta-se nosso santo pela vida dos missionários? Deixo que ele mesmo responda: “Não me queixo nem o digo, Senhor, pelos semeadores; só pela seara o digo, só pela seara o sinto. Para os semeadores, isto são glórias: mirrados sim, mas por amor de vós mirrados; afogados sim, mas por amor de vós afogados; comidos sim, mas por amor de vós comidos; pisados e perseguidos sim, mas por amor de vós perseguidos e pisados”.
São José de Anchieta nos ensina, a respeito da missão de evangelizar, que “nada é árduo aos que têm por fim somente a honra de Deus e a salvação das almas, pelas quais não duvidarão dar a vida”.
Para nós, que vivemos numa época em que a Igreja está bem estabelecida, e que, no caso do Brasil, a maior parte da população se declara católica, pode parecer que esse mandamento perdeu, se não a força, pelo menos a urgência. “O Evangelho já foi anunciado”, alguém poderia argumentar. Nada mais distante disso. Há quase cinquenta anos, um bispo procurou um jovem padre com um apelo: “Os batizados precisam ser catequizados.” Esse bispo era Dom Antonio Afonso de Miranda, e ele falava com o padre Jonas Abib. “Nascemos da necessidade de evangelizar e para evangelizar”, nos ensina o fundador da Canção Nova. A dura verdade é que os batizados realmente não são catequizados. Quantas pessoas declaram-se católicas, mas não sabem o básico da fé e por isso vivem afundados no pecado, longe de Deus! É um povo que se perde por falta de conhecimento, como diz o profeta Oseias. Além disso, há aqueles que subvertem o Evangelho, querem mutilá-lo, esfacelá-lo para que não tenham que se converter. Sobre esses, muito bem advertiu São Paulo: “Mas se nós ou algum anjo do céu vos anunciar um evangelho diferente daquele que vos anunciamos, seja maldito” (Gálatas 1,8).
Se eu tenho o privilégio de conhecer a Cristo e por isso deixo que ele transforme a minha vida, ou seja, se experimento a conversão diária, por que vou querer isso apenas para mim? Um cristão realmente convertido tem amor pelas almas e não fica assistindo de camarote o mundo pegar fogo. Por isso, devemos entender que aquela ordem de Deus de ir pelo mundo e pregar o Evangelho não foi endereçada somente a alguns escolhidos. Mesmo que seja num ambiente mais específico, mais restrito, eu sou chamado a evangelizar, a catequizar aqueles que, porque não conhecem bem a nossa fé, vivem longe de Deus. Isso vale para as crianças: os primeiros catequistas das crianças devem ser seus pais. Se você não tem filhos, mas tem sobrinhos, a mesma regra se aplica. Assuma a missão de ser catequista dos seus sobrinhos. Se no seu trabalho há pessoas de coração aberto para saber mais sobre Cristo, seja catequista no trabalho. Não precisamos de uma carteirinha de catequista para anunciar o Evangelho. Precisamos de amor pelas almas.
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Santa Faustina faz um relato terrível sobre o último dia de carnaval de 1937. O Senhor lhe deu a graça de conhecer, num instante, os pecados do mundo inteiro cometidos naquele dia. Diz a santa que ela desfaleceu de terror: “Apesar de conhecer a profundeza da misericórdia de Deus, admiro-me que Deus permita que a humanidade exista”. Mas ela não parou nisso. Era o seu amado que estava sendo ofendido, por isso ela, ao invés de se revoltar contra os pecadores, de ofendê-los e apontar seus erros, sua atitude foi suplicar ao Senhor: “Jesus, ofereço tudo pelos pecadores, que os golpes da Vossa justiça caiam sobre mim, e o mar da misericórdia envolva os pobres pecadores”. Santa Faustina sentia verdadeira pena dos pecadores e dizia que não podia suportar que uma alma que tanto custou a Jesus tivesse que perecer. Por isso mesmo ela rezava sem cessar e fazia sacrifícios e penitências pela conversão deles.
A vocação da Apóstola da Misericórdia era a clausura e talvez não nos sejam pedidos tantos sacrifícios quanto Cristo pediu a ela, mas o que podemos fazer pelas almas e pelo Reino de Deus? Assumir a missão de ser evangelizadores, de ser catequistas. Não fugir das oportunidades que Deus nos der para testemunhar o amor de Deus por nós, para esclarecer quem está confuso sobre o que significam o Sacrifício e a Redenção de Cristo e assim por diante.
Podemos rezar, inspirados por São José de Anchieta e por Santa Faustina: “Meu Deus, dai-me essa mesma gana pela salvação das almas! Quantos pecadores esperam pelas minhas orações para serem alcançados pela graça de Deus!”