Você já parou para pensar o que é de fato ser cristão? Em algum momento você considerou a grande missão que porta ao assumir o seguimento a Cristo?
Estamos envolvidos em inúmeros fatos recentes que nos direcionam a refletir sobre o ser Igreja: há pouco tempo tivemos o fim e o início de um novo Pontificado – e foi um movimento grandioso gerado neste processo, envolvendo não apenas os fiéis, além de provocar tão grande júbilo e ânimo a toda Igreja – e se aproxima o dia de Pentecostes, o momento em que “a Igreja se manifestou publicamente” (AG, 4). Olhando apenas para estes dois fatos, poderíamos tecer uma longa reflexão sobre o nosso lugar, a nossa relação e nossa pertença à Igreja, por exemplo. Mas vamos refletir sobre um outro ponto: a grande coragem que é ser cristão!
A história da nossa Igreja perpassa estes 2025 anos. Iniciada no Oriente Médio, a religião se expandiu e, em menos de 100 anos, estava presente na África, na Ásia e na Europa. Porém, este começo, não foi tão fácil assim. Se Cristo, a pedra fundamental da Igreja, foi crucificado por aquilo que ensinou e viveu, não seria diferente no decorrer da história. A história da Igreja é uma história de perseverança e de fidelidade ao mandato do Senhor que, já no texto dos Evangelhos, expressava que para segui-lo, seria necessário que cada um tomasse sua cruz (Cf. Mt 16, 24). A história da Igreja, com o testemunho de seus membros, sobretudo de seus mártires, se tornaria terreno fértil para a expansão da religião. Tertuliano expressou que “o sangue dos mártires é semente de novos cristãos”. E, aqui, podemos nos questionar sobre esta frase: não parece uma grande loucura ver que mesmo diante de tantos sofrimentos a Igreja continuou a crescer, alcançando mais fiéis?
Vamos pensar primeiro sobre os mártires. Por que razão uma pessoa defenderia com tanto afinco uma ideia a ponto de preferir dar a vida? O que faria uma pessoa preferir a morte e o sofrimento em vez de “simplesmente” negar uma “crença”?
O Catecismo da Igreja Católica (2473) nos ensina que o martírio é este “testemunho da verdade da fé e da doutrina cristã” dado por aqueles que se uniram a Cristo, na caridade, a ponto de não desejarem nada além de estar com Ele. O martírio é o sinal daqueles que entenderam que as coisas do mundo são passageiras e que é na eternidade, junto de Deus, que se encontra a razão e o sentido de toda existência. É esta grande descoberta que motivaram os santos a anunciarem a Jesus Cristo, pregando incansavelmente. É esta descoberta que atraiu homens e mulheres ao longo de toda a história da Igreja, para que se dedicassem a esta causa – o Bem Maior. Lembre-se agora do seu santo de devoção: ele fez essa descoberta e a ela se entregou totalmente.
Entretanto, o martírio não é uma graça que todos os santos viveram – ao menos não o martírio de sangue. Mas história de cada santo revela esta profunda união com Deus que o moveu a anunciá-lo, a falar dele, a torná-lo conhecido e a dedicar cada segundo de sua vida ao Senhor, mesmo nas lutas, nas dificuldades e nas perseguições. Eles descobriram o Bem Maior. A experiência de conversão, o encontro pessoal com Jesus Cristo, o Batismo no Espírito Santo, permite esta mudança radical, esta descoberta. E, à medida que nós nos abrimos ainda mais a esta graça, mais e mais vamos nos entregando de todo o coração, mesmo diante das lutas e das dificuldades. É a virtude da fortaleza que concede este ânimo, capaz de mover a pessoa a alcançar um bem, mesmo diante dos riscos. É esta virtude que nos move a querer anunciar a Jesus Cristo, antes e acima de todas as coisas, e a permanecer com Ele.
São Bonifácio foi um bispo que nasceu na Inglaterra e viveu seu apostolado onde hoje é o território da Alemanha, no século VIII. Em situações totalmente desfavoráveis, ele se empenhou a evangelizar comunidades pagãs. Em uma de suas cartas, o Bispo descreve a Igreja como uma grande barca sacudida pelas tentações deste mundo, mas governada por grandes homens que se dedicaram totalmente a ela, até mesmo derramando seu sangue. São Bonifácio assume que ao ver o testemunho dos mártires, sente-se apavorado e ao pensar em abandonar esta barca, é tomado de confiança, a confiança no Senhor que conduz todas as coisas. Ele descreve ainda:
“Não sejamos cães mudos, não sejamos sentinelas caladas, não sejamos mercenários que fogem dos lobos, mas pastores solícitos, vigilantes sobre o rebanho de Cristo. Enquanto Deus nos der forças, preguemos toda a doutrina do Senhor ao grande e ao pequeno, ao rico e ao pobre, e todas as classes e idades, oportuna e inoportunamente”.
São Bonifácio se empenhou em tonar conhecido Aquele a quem ele descobriu – Jesus Cristo – e mesmo tendo experimentado o medo, continuou a sua entrega fielmente. Em 05 de junho de 754, Bonifácio foi martirizado. Deu a sua vida por causa de Cristo!
A coragem de ser cristão provém da certeza de que o Senhor não abandona os seus, de que é Ele quem nos sustenta e de que aqui, nesta vida, tudo é passageiro – somos cidadãos do Céu. A coragem do testemunho cristão, seja o martírio ou testemunho diário de uma vida ordinária dedicada a Deus, é consequência da experiência com Aquele que tanto amou, a ponto de dar a sua vida na Cruz por mim! A coragem de ser cristão não é meramente um esforço pessoal, mas é uma relação de causa e consequência: eu me entrego todo ao Senhor e Ele me sustenta! A coragem de ser cristão é saber que no final de tudo o Senhor prevalece.
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Para encerrar, um breve relato que ficou famoso nos últimos meses. No ano de 2005, o Cardeal Ratzinger foi eleito papa (Bento XVI), sucedendo a São João Paulo II. No momento em que ele aparecia na sacada para saudar o povo, as câmeras focavam os cardeais e chamou a atenção o Cardeal Francis George, dos EUA. Enquanto todos olhavam o povo ou o novo Pontífice, seu olhar parecia perdido, olhando ao longe. Perguntaram a ele, posteriormente, o que ele olhava. O Cardeal respondeu:
“Eu estava olhando na direção do Circo Máximo, do Monte Palatino, onde os imperadores romanos outrora residiam e reinavam, e de onde assistiam às perseguições dos cristãos, e pensei: Onde estão seus sucessores? Onde está o sucessor de César Augusto? Onde está o sucessor de Marco Aurélio? E, finalmente, quem se importa? No entanto, se você quiser ver o sucessor de Pedro, ele está bem aqui do meu lado, sorrindo e acenando para as multidões.”
A Igreja nunca foi desamparada. Os fiéis nunca foram desamparados. Repito, a coragem de ser cristão é saber que no final de tudo o Senhor prevalece.
“Não tenhais medo!” (Papa Leão XIV)
Referências:
Decreto AD GENTES do Concílio Vaticano II
Catecismo da Igreja Católica
Liturgia das Horas: Segunda leitura do Ofício de Leituras da Memória de São Bonifácio.
Teologia da Perfeição Cristã – Antonio Royo Marín, OP