Podemos receber o sacramento da Eucaristia todos os dias?
Receber o sacramento da Eucaristia ao menos pela Páscoa da ressurreição – esse é o terceiro mandamento da Igreja. E eu tenho uma pergunta para iniciarmos este assunto: podemos receber o sacramento da Eucaristia todos os dias ou pelo menos com uma frequência maior? Para responder essa indagação, iremos recorrer à história da Igreja Católica, e quem nos ajudará será São Tomás de Aquino. Confira esse trecho da Suma Teológica:
“A Igreja estabeleceu legislações diversas conforme as circunstâncias diversas dos tempos. Assim, na Igreja primitiva, quando era intenso o fervor da fé cristã, determinou que os fiéis comungassem diariamente. Por isso, o Papa Anacleto determinou: terminada a consagração, comunguem todos os que não quiserem ficar excluídos da assembleia dos fiéis; pois, assim o determinaram os Apóstolos e o tem a Santa Igreja Romana. Mais tarde, porém, diminuindo o fervor da fé, o Papa Fabiano permitiu que, se não mais frequentemente, pelo menos três vezes no ano todos comungassem — na Páscoa, no Pentecostes e no Natal do Senhor. Também o Papa Sotero determinou que se comungasse pela Ceia do Senhor. Mas depois, pela multiplicação da iniquidade, resfriando-se a caridade de muitos, Inocêncio III estatuiu, que os fiéis comungassem pelo menos uma vez no ano, na Páscoa. ” (Cf. S. T., III, q. 80, a. 10).
Vemos, portanto, segundo a descrição de São Tomás, que houve orientações diferentes conforme as circunstâncias do tempo, em especial, conforme a intensidade da fé e caridade dos fiéis. O mandamento eclesial visa estabelecer um mínimo a ser cumprido por parte dos fiéis. O que não significa que se deve comungar sacramentalmente apenas uma vez por ano. Seria uma grande loucura, ter a possibilidade de receber o Senhor todos os dias em nossa alma, mas aceitá-Lo somente em um único dia do ano.
A Eucaristia é o Pão de cada dia
Existe um vasto ensinamento da própria Igreja a respeito da maneira como devemos nos preparar para receber este sacramento e o quanto devemos progredir na frequência do seu recebimento. São Pio X, conhecido como o Papa da Eucaristia, por meio da Encíclica Editae Saepe, ensinou-nos o seguinte:
“Os pastores e pregadores – escreve o santo Bispo – devem aproveitar todas as oportunidades possíveis para exortar o povo a cultivar a prática de receber frequentemente a Sagrada Comunhão. Nisto eles estão seguindo o exemplo da Igreja primitiva, as recomendações dos Padres mais autorizados , a doutrina do Catecismo Romano e, finalmente, o ensinamento do Concílio de Trento. O último mencionado faria com que os fiéis recebessem a Comunhão em cada Missa, não só espiritualmente, mas sacramentalmente. Ele descreve a intenção e o carinho que se deve ter ao se aproximar do Banquete Sagrado nas seguintes palavras: “Parece que os nossos dias de fé vacilante e de frieza precisam deste mesmo fervor de modo especial, para que a recepção frequente da Sagrada Comunhão não seja acompanhada por uma diminuição da reverência para com este grande mistério. Pelo contrário, por essa frequência, um homem deve ‘provar a si mesmo e, assim, coma desse pão e beba do cálice’” (Cf. Editar Saepe n.36).
Longe de fazermos isso de maneira negligente, o convite é para que vivamos conforme os cristãos da Igreja Primitiva, com fé viva e caridade ardente. Os sacramentos, de maneira geral, são causas de santificação pessoal para aquele que o recebe, e com a Eucaristia não é diferente. O bom hábito de comungar frequentemente, quando feito da maneira correta, confere frutos de verdadeira conversão e santificação (Cf. CIC 1391-1395).
Não coma sua própria condenação
Examine-se cada um a si mesmo e, assim, coma do Pão e beba do Cálice, pois quem come e bebe sem distinguir devidamente o Corpo, come e bebe sua própria condenação (Cf. I Cor 11, 28-29). Como ensina São Paulo, não podemos comungar de qualquer jeito. É necessário fazer da maneira correta: “Aquele que quiser receber Cristo na Comunhão eucarística deve encontrar-se em estado de graça. Se alguém tiver consciência de ter pecado mortalmente, não deve aproximar-se da Eucaristia sem primeiro ter recebido a absolvição no sacramento da Penitência” (Cf. 1415). Em nome da comunhão frequente, não podemos faltar com a reverência com o Corpo e Sangue de Nosso Senhor. Por isso, a urgência de compreendermos sobre o que caracteriza o pecado mortal, mas isso será assunto para outro artigo. Sigamos em frente…
Uma escola de santidade
A vida dos santos da Igreja são verdadeiros exemplos que devemos seguir. São João Paulo II, sempre após a comunhão eucarística, se dedicava a ficar alguns minutos em silêncio, adorando e amando o Senhor. São Francisco de Sales dizia o seguinte: “Duas espécies de pessoas devem comungar com frequência: os perfeitos para se conservarem perfeitos, e os imperfeitos para chegarem à perfeição”. Santo Afonso dizia: “A comunhão diária não pode conviver com o desejo de aparecer, vaidade no vestir, prazeres da gula, comodidades, conversas frívolas e maldosas. Exige oração, mortificação, recolhimento”. E Santo Agostinho também ensinava: “Recebe o que diariamente te é útil e vive de modo que mereças recebê-lo cotidianamente”. Perceba, pelo exemplo dos santos, o quanto eles se dedicavam em levar uma vida virtuosa e de oração pessoal. Ao mesmo tempo, quando recebiam Jesus eucarístico, se voltavam inteiramente para o Senhor, fazendo daquele momento uma ocasião de exercício da própria fé e crescimento da caridade. Esse deve ser o nosso empenho.
Mãos à obra
Ao receber o Corpo e Sangue do Senhor, dirija-se interiormente a Ele, converse com Jesus, diga palavras de adoração e louvor. Peça aquilo que está ordenado para sua salvação. Isso é fácil! Diga a Ele: “aumenta a minha fé, Senhor! Permita que eu veja os seus ensinamentos e os siga. Converte a minha vida e me faz santo”. Por fim, para somar as suas orações, compartilho a oração escrita por São Tomás de Aquino que pode ser usada após a comunhão: “Dou-vos graças, Senhor santo, Pai onipotente, Deus eterno, a vós que, sem merecimento nenhum de minha parte, mas por efeito de vossa misericórdia, vos dignastes saciar-me, sendo eu pecador e vosso indigno servo, com o corpo adorável e com o sangue precioso do vosso Filho, Nosso Senhor Jesus Cristo. Eu vos peço que esta comunhão não me seja imputada como uma falta digna de castigo, mas interceda eficazmente para alcançar o meu perdão; seja a armadura da minha fé e o escudo da minha boa vontade; livre-me de meus vícios; apague os meus maus desejos; mortifique a minha concupiscência; aumente em mim a caridade e a paciência, a humildade, a obediência e todas as virtudes; sirva-me de firme defesa contra os embustes de todos os meus inimigos, tanto visíveis como invisíveis; serene e regule perfeitamente todos os movimentos, tanto de minha carne como de meu espírito; una-me firmemente a vós, que sois o único e verdadeiro Deus; e seja enfim a feliz consumação de meu destino. Dignai-vos, Senhor, eu vos suplico, conduzir-me, a mim pecador, a esse inefável festim onde, com o vosso Filho e o Espírito Santo, sois para os vossos santos luz verdadeira, gozo pleno e alegria eterna, cúmulo de delícias e felicidade perfeita. Pelo mesmo Jesus Cristo, Senhor Nosso. Amém.”