Reconhecida pela sua santidade de vida, íntima ligação com Jesus e os santos, e tendo explicado como ninguém a vida de oração em vários de seus livros, Santa Teresa d’Ávila recebe uma ordem de seus confessores: Escrever um livro explicando o progresso da vida espiritual.
Nascia, em 1577, o “Livro das Moradas ou Castelo Interior”. E, como vimos no artigo anterior, cumpria exatamente o que se propunha. Através de uma visão dada por Deus, a doutora da Igreja viu a alma humana como se fosse um castelo feito inteiramente de puríssimo cristal.
Esse castelo possui uma dignidade ímpar à medida que é habitado pelo próprio Deus, o Senhor do Castelo. Segundo Santa Teresa d’Ávila, Deus mesmo sustenta o castelo da alma, habitando na sétima morada, e procurando atrair o homem ao seu convívio próximo.
Embora se viva sob e com tamanha dignidade, continuamente esta intimidade é perdida ao se preocupar não com o interior do castelo, ou o conhecimento da própria alma, mas com suas cercanias, com as muralhas deste castelo que são o corpo, as vivências sociais e preocupações com o mundo à volta.
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Romper com o que há de desvirtuado e pecaminoso no mundo, permanecendo em estado de graça, é a condição básica para penetrar neste castelo interior em busca daquele que É.
Neste caminho, os motores que impulsionam a alma rumo à sua morada central, são a reflexão e a oração. Através da reflexão, toma-se conhecimento de si mesmo, das dificuldades e misérias, corrigindo-as através da negação do egoísmo e da autossuficiência.
Pela oração, abandona-se sob as inspirações de Deus, aumentando a intimidade com seu hóspede e criador, até conseguir, finalmente, a união das vontades, onde não existe mais diferença entre o querer do homem e de Deus.
No livro “Santidade para todos: descobrindo as moradas interiores”, existe um estudo detalhado de cada morada e o modo de se avançar por elas em busca da verdadeira contemplação, unindo não só o conteúdo de Santa Teresa mas, também, de São João da Cruz, São Tomás de Aquino e outros que nos ajudam a trilhar esse caminho de encontro com o Senhor.
Por isso, em vez de colocarmos aqui um resumo muito insuficiente do Castelo Interior, gostaria de chamar a atenção para a solidez do ensinamento da santa carmelita. Não é uma figura de linguagem a imagem deste castelo (nossa alma) com a presença de Deus na morada central, a sétima, dando vida e sustentando a alma.
Santo Agostinho já havia chamado a atenção para essa realidade: “Tarde te amei, ó beleza tão antiga e tão nova. Eis que habitavas dentro de mim e eu te procurava fora!”
Mas, se podemos admirar a força poética de Santo Agostinho e Santa Teresa, é São Tomás de Aquino quem não nos deixa mais dúvidas:
“Deus está em tudo por seu poder, porque tudo está submetido a seu domínio. Ele está em tudo por sua presença, porque tudo está descoberto e à mostra de seus olhos. Ele está em tudo por sua essência, porque está presente em todas as coisas como causa do ser de todas elas” (ST I Q8).
Existem três formas distintas da presença de Deus na alma: por poder, por presença e por essência. Entretanto, posteriormente, na questão sobre a missão das pessoas divinas, Santo Tomás de Aquino (ST I Q43) determina um quarto modo da presença de Deus que só convém à criatura racional, a qual nomeia “graça santificante”.
É através da graça santificante que Deus não somente se encontra no ser humano, mas nele habita como em seu templo. Essa graça santificante é o próprio Espírito Santo dado em missão e passando, por isso, a habitar o homem real e objetivamente, tal qual determina a visão teresiana.
Como viver com tamanho dom da presença de Deus em si mesmo? Como se tornar apto para que a inabitação de Deus em nós se torne mais do que um presente, mas um caminho certo de santidade e salvação? Santa Teresa d’Ávila, mais uma vez, nos mostrará o caminho através da oração pessoal. Este será o tema do nosso próximo artigo sobre a doutora da Igreja.