Homilia do Jubileu dos sacerdotes no Santuário

Homilia de Dom João Inácio Müller, bispo de Lorena, no Jubileu dos sacerdotes

“A pessoa do vigário-geral, Monsenhor Silva, a pessoa do reitor deste Santuário, também pai fundador da Comunidade Canção Nova, Monsenhor Jonas, saúdo todos os padres e também me permito saudar todos, todo o povo de Deus aqui presente em grande número no nosso Santuário e estendo o meu abraço de saudação a cada pessoa que nos acompanha através da TV Canção Nova.

São João Maria Vianney, patrono dos sacerdotes

Celebramos hoje o patrono de todos os padres: São João Maria Vianney, o Cura, o Pároco da cidadezinha francesa de Ars, no dizer de São João Paulo II, modelo sem par para todos os lugares no desempenho do ministério e da santidade do ministro e paradigma para a nova evangelização.
Nascido de uma família de camponeses católicos e muito caridosos, João Maria tinha 7 anos quando o terror da Revolução Francesa reinava em Paris. E os padres eram exilados ou mortos. Ele recebeu a Primeira Comunhão aos 13 anos quando a Igreja de sua cidade foi fechada e as tropas revolucionárias atravessavam a paróquia. O então governo revolucionário estabeleceu a Constituição Civil do clero e só os padres que faziam este juramento cismático eram conservados nos seus cargo. Os outros padres, fiéis à Igreja e que não aceitavam aquele cisma, eram perseguidos. Mas mesmo assim, atendiam secretamente os fiéis nos paióis das fazendas. Foi a visão destes heróis da fé, que fez surgir no jovem Vianney a sua vocação sacerdotal, candidato, pois, ao heroísmo e à cruz no ministério. Como nós sabemos, ele enfrentou dificuldades no seminário, onde chegou a ser despedido por incapacidade nos estudos. Teve até problemas com o serviço militar, e aí também foi despedido. Consegui porém, aos vinte e nove anos de idade, ser ordenado sacerdote, mas ainda sem permissão para ouvir as Confissões. Após três anos, foi enviado a uma pequeníssima paróquia, Ars, onde permaneceu durante quarenta e dois anos, até ao fim da sua vida. ‘Há pouco amor de Deus nessa paróquia, há pouco amor de Deus nessa paróquia’, disse-lhe o vigário-geral ao nomeá-lo. Vossa Reverendíssima procurará colocá-lo, colocar o amor lá, naquela cidadezinha de Ars. De fato, o vilarejo Ars, nesse período pós Revolução Francesa estava esquecido de Deus: pouca frequência de Missas, trabalho contínuo aos domingos, bailes, blasfêmias… O Padre Vianney começou com penitências e orações próprias, longas, pregação e catequese contínuas, visitas às famílias e caridade para com os pobres. A Igrejas de Ars foi-se enchendo. Ele ouvia Confissões desde a madrugada até noite, peregrinos de toda a França acorriam a Ars, chegando a 100 000 por ano. Suas pregações eram assistidas por bispos e cardeais e, muitos sacerdotes. Seu catecismo era ouvido por grandes pregadores que ali vinham aprender com tanta sabedoria e ele, Padre Vianney, morreu aos 74 anos esgotado pelas penitências e trabalhos apostólicos no ministério sacerdotal. Dizia esse herói da fé, no final da sua vida, na hora de morrer: “É belo morrer depois de ter vivido na Cruz”.

Nulidade humana e a grandeza do poder de Deus

Procissão de entrada, em direção à Porta Santa da Misericórdia

Por essa razão, a Igreja escolheu este santo, tão simples, para patrono dos padres. E nós podemos nos perguntar: ‘Sim, Deus escolheu este sacerdote como patrono: mas qual é a razão de fundo?’ A razão de fundo é porque sua vida demonstra a nulidade humana. Ele foi escolhido como o patrono dos padres porque a sua vida demonstra, dia após dia, a nulidade humana e a grandeza do poder de Deus; nulidade humana e a grandeza do poder de Deus, para que aprendamos, nós, padres, para que nós aprendamos que não são nossos dotes e qualidades humanas que salvam as almas. Não tem um padre que salva mais almas do que outro. Então, não são nossos dotes e qualidades que salvam as almas. Deus é o protagonista de toda a ação pastoral. Cristo é o Salvador. Que todos os fiéis rezem pelos nossos sacerdotes; que eles sejam santos e que eles, por conseguinte, vejam Deus: ‘bem-aventurados os puros porque verão a Deus’. Santo Ireneu diz que nós só vivemos de vemos Deus. O ser humano precisa ver o Amor, o Amado, Aquele em quem coloca o todo da sua vida. Então, que todos os fiéis rezem pelos nossos sacerdotes e seminaristas para que imitem a humildade, pobreza, retidão, zelo e fidelidade deste grande herói do ministério sacerdotal, que tanto honrou o sacerdócio paroquial e a Igreja de Cristo. Então, que todos nós tenhamos essas qualidades que brotam do Cristo. Cristo é esse Sacerdote pobre, humilde, reto, zeloso, fiel.

Jesus quer ser reconhecido pelos Seus discípulos

No Evangelho de hoje, ‘Aquele que é’ pergunta aos discípulos quem Ele é para poder introduzi-los no Seu ministério. Essa pergunta é importante dirigida também a cada um de nós. O que está em jogo não é a identidade de Jesus, de Jesus Cristo, mas a identidade deles, dos discípulos. Jesus quer ser reconhecido. Este é o desejo fundamental do amor que Se revela. A resposta dos discípulos não vai constituir Jesus mas vai constituir o verdadeiro discípulo. Assim, aparece nítido que o cristianismo é minha relação com Jesus. É o amor ao meu Senhor em resposta ao Seu amor por mim.

Quando nós descobrimos o quanto nós somos amados, quando descobrimos isso, e nós nos abrimos a esse amor, a nossa vida, de fato, não nos pertence mais. Nós vamos nos jogar inteiramente nesse dinamismo de entrega que Cristo viveu. E nós, para sermos padres, mesmo, sacerdotes de Deus e da Igreja, nós precisamos chegar nesse ponto. Precisamos nos colocar no discernimento, todos os dias. A começar por mim, todos os dias, de novo. Quando a gente percebe que a gente é amado por Deus, a gente não precisa mais do que isso. Muitas ‘picuinhas’, coisas pequenas, vão cair no chão. Eu vou deixar de lado tanta coisa que só atrapalha a nós. Se eu sei que eu sou amado por Jesus, e Jesus, no Seu amor me ama totalmente e Ele me confia a missão, e a missão, assim, que é d’Ele. Ele disse: ‘Vão, em Meu nome! Levem-Me por todos os lugares onde Eu mesmo deveria ir.’
Jesus, ontem e hoje, e hoje, eu com Jesus; nós com Jesus, cada um de nós.
Aparece nítido que o cristianismo é a minha relação com Jesus, o meu amor ao meu Senhor em resposta ao Seu amor por mim. A resposta dos discípulos é absolutamente pessoal. E Jesus Se dá a conhecer: não é um Messias glorioso, rico, poderoso, como deseja a vaidade humana. E, também, nós temos um pouquinho disso. Ele é um Messias pobre, humilde, e servidor.

Testemunho | sacerdote deve ser pobre, humilde, servidor

Nós estávamos tomando cafezinho à pouco, e uma das meninas missionárias disse: ‘Não, bispo, deixe que eu te sirvo, café com leite…’ ‘Filha, eu te agradeço muito, mas eu prefiro eu mesmo me servir, senão sou capaz de me acostumar a ser servido’.
E depois a gente se torna um pequeno rei e isto não é bom. A gente deixa de ser aquele padre de Jesus, padre da Igreja. Não que a gente não se pode deixar servir mas a gente sempre tem que ficar atento. Todos nós, padres! Nosso povo é tão bom, o povo nos quer tanto bem que pode, de vez em quando, fazer um ídolo de nós. Temos que cuidar, a começar pelo bispo, tem que cuidar muito. Jesus, quando Ele fazia grandes coisas, e todo o mundo falava bem dele, Ele dizia: ‘Está na hora de ir embora daqui. Vamos para outros lugares.’ Ele não Se deixava endeusar. O endeusamento faz bem para a vaidade humana mas não para a nossa relação com Deus. Ele, Nosso Senhor, é o Messias pobre, humilde, servidor. A distância entre o pensamento divino e o pensamento humano é incomensurável. Segundo Jesus, é diabólica, essa distância, é diabólica. Para nossa mundanidade, diz: ‘Vai para longe, Satanás!’. E nos provoca: ‘aprende a pensar como Deus pensa. É possível! Você foi criado para isso: para pensar como Deus pensa’. Agora que os discípulos chegaram à fé em Sua messianidade, Jesus pode revelar a verdade desta messianidade. E a verdade é a cruz. Maravilha, né? A verdade é a Cruz, o amor que vai até à entrega da vida. O amor que vai até à entrega da vida. O único que pode dar um sentido à vida e à morte, o único que pode salvar. Assim, o Senhor consagra e constitui os Seus discípulos dizendo: ‘Imprimirei Minha lei em suas entranhas e hei de inscrevê-la em seu coração. Serei seu Deus e eles serão o Meu povo’, como hoje nos falou pelo profeta Jeremias.

Igreja e o mundo são os espaços abertos da missão

Início da celebração da Santa Missa com os sacerdotes da diocese de Lorena, no Santuário do Pai das Misericórdias

Falando a padres, na Polônia, agora, o Papa Francisco disse que Jesus deseja que a Igreja vá pelo mundo e quer que eu faça assim como Ele próprio fez, como Ele foi enviado ao mundo pelo Pai: não como poderoso mas na condição de servo; não para ser servido mas para servir; e para levar a boa-nova a todos. Continuando, acrescentou o Papa: ‘E, assim, são enviados os Seus em todos os tempos. Jesus envia-os em missão, quer que saiam a espalhar o perdão e a paz de Deus com a força e na força do Espírito Santo. Esta chamada é também para nós, para nós. Sabemos que na nossa vida de sacerdotes pode haver, muitas vezes, uma tentação de permanecer um pouco fechados, por comodidade, por inibição, fechados em nós mesmos e nas nossas coisas. E, no entanto, a direção indicada por Jesus é de sentido único: sair de nós mesmos, todos os dias, sair de nós mesmos. Trata-se de realizar um êxodo do nosso eu, de perder a vida por Ele, seguindo o caminho do dom de si mesmo. Por outro lado, Jesus não gosta das estradas percorridas à metade, das portas entreabertas, das vidas com via dupla. Pede para se ‘meter à estrada’, leves, para sair renunciando as próprias seguranças, firmes apenas n’Ele. E, nós sabemos por experiência própria, quando estamos firmes n’Eles, não precisamos das outras coisas, nós não precisamos de nada. Quem de nós precisa de muita coisa e faz muita questão, uma pessoa exigente e complicada que sempre enrola tudo, é muito ‘cricri’, a começar pelos bispos e pelos padres, nós ainda não estamos firmes n’Ele. Quando nós encontramos o Senhor, nós nos tornamos simples, pessoas transparentes que não complicam. Quando nós complicamos ainda estamos servindo a nós e não a Ele. A vida dos discípulos mais íntimos de Jesus, como nós, somos chamados, nós os mais íntimos de Jesus, nós somos chamados a manter proximidade constante com o Senhor para sermos, dia após dia, constituídos pelo Senhor. Esta vida, é feita de amor concreto, isto é, de serviço e disponibilidade. É uma vida onde não existem ou, pelo menos, não deveriam existir espaços fechados e propriedades privadas para a própria comodidade. Quem escolheu configurar com Jesus toda a existência já não escolhe os próprios locais mas vai para onde é enviado – disse ainda o Papa, na Polônia – pronto a responder a quem o chama. Pára na estrada, muda a sua agenda como aquele samaritano que desceu e auxiliou aquele outro senhor caído à beira da estrada. A nossa agenda não é feita por toda a semana, nem por um dia inteiro. Quando alguém aparece na estrada tudo deve parar. As pessoas entendem até quando eu chego um pouquinho atrasado na Missa porque eu socorri alguém. Era Jesus. A nossa fé nos diz isso. Nós somos chamados nessa proximidade com o Senhor a sermos e a estarmos prontos a responder a quem chama, já não escolhendo sequer os tempos próprios. A casa onde habita não lhe pertencem porque a Igreja e o mundo são os espaços abertos da missão. O seu tesouro é colocar o Senhor no meio da vida, sem nada mais procurar para si. Assim, foge das situações gratificantes que o colocariam no centro, não se ergue sobre o extremo dos pedestais dos poderes do mundo, nem se reclina nas comodidades que enfraquecem a evangelização, não perde tempo a proteger um futuro seguro e bem retribuído. Feliz no Senhor, não se contente com uma vida medíocre, mas arde em um desejo de dar testemunho e alcançar os outros; gosta de arriscar e de sair: é uma pessoa na estrada.

O sacerdote é grande graças à pequenez do Senhor

Terminando, já falei isso antes, mas de novo, parabéns! Sintam agora, de novo, aquele olhar que dei para vocês, o abraço a cada um de vocês. Hoje, na minha vida de bispo, eu senti muita alegria ao cumprimentar cada um de vocês. Digo isso, sinceramente. No ano passado, não foi assim, nem no outro ano. É o terceiro, aqui com vocês, sinto muita alegria. Cada um de vocês que vi aqui, que pude cumprimentar, pude abraçar. Isto é bonito, isto é o esforço, é o mínimo do esforço que nós somos chamados a fazer, nos congregar. É uma alegria para cada padre estarmos aqui. Mas eu fiquei muito feliz em cumprimentar vocês: cumprimentar o sacerdote, o padre, o sacerdócio, o ministério, a grandeza de vocês por causa da pequenez do Senhor. Ele ergueu vocês! Que a vida d’Ele apareça em vocês. Porque Ele ergueu vocês, Ele Se confiou a vocês. Ele sabe que vocês também são frágeis, pequeninos. Mas Ele torna e tornou vocês fortes, porque o Espírito Santo, Ele concedeu a vocês. Cultivem a beleza do Espírito do Senhor e do Seu santo modo de operar no dia a dia de vocês. Então, parabéns, caros padres, parabéns pelo dom que Deus lhes fez! Parabéns e gratidão pelo sim a Deus no serviço desmedido na Igreja! E, nós, ainda temos um serviço bastante organizado. Poucas vezes, ou quase nunca, nós chamados a sair às 2h da manhã para sair de casa, chuva, no lombo do cavalo, barro, como os padres de outros tempos faziam. Eles iam com carinho, alegrando-se porque estão fazendo isso pelo Reino, tão podendo viver a vida de padre. Que a preguiça nunca nos visite. E nós nunca adiemos quando alguém nos telefona, nos pede: ‘Padre, precisa de ir no hospital, tem alguém morrendo.’. ‘Padre, preciso confessar’; atende! Nós não sabemos se vai ter um depois.

Sejamos outros Cristos!

O povo de Deus vê e encontra em vocês o próprio Cristo. Já pensaram nisso? Isto é verdade. O povo de Deus vê em vocês e encontra em vocês o próprio Cristo. Por isso, as pessoas chegam e gostam de dar a mão, um abraço: ‘Padre, bênção.” É o Cristo! Ele tem um olhar bonito, límpido. O povo vê. Porque o próprio Cristo habita em vocês. Não obstante as fragilidades e as fraquezas. Cristo nunca sai de vocês. Ele abraçou vocês, Ele está com vocês constantemente. E o povo simples de Deus toca Cristo ao tocar vocês. O povo de Deus quer que vocês toquem a cabeça deles porque é o próprio Cristo que toca vocês. O povo de Deus quer Deus assim como Jesus chamou os discípulos para ficar perto d’Ele, Jesus queria dizer: ‘Todos devem ficar perto de Mim! Quem está perto de mim é feito por Mim’, ou seja, n’Ele dá para ver a semelhança com o Divino. Então, o povo de Deus vê e encontra em vocês o próprio Cristo. Sejamos outros Cristos! Sejamos outros Cristos! Vamos cultivar isso: sejamos outros Cristos!
Deus vos abençoe! Que Deus abençoe cada um de vocês e lhes dê o cêntuplo porque Ele prometeu e Ele faz isto. Então, que Deus abençoe cada um de vocês e conceda a cada um de vocês o cêntuplo, que é Ele, a Vida Eterna. E a nós, Ele já dá pai, mãe, irmãs… Temos tudo. É graça, é benção de Deus!
Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo!”

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