Homilia: chamado à vida, à conversão e ao acolhimento da misericórdia do Pai
Hoje, 5 de dezembro de 2016, a diocese de Lorena e a Comunidade Canção Nova festeja os dois anos de dedicação do Santuário do Pai das Misericórdias.
Confira a homilia de Dom João Inácio Müller, na íntegra:
“Nós estamos congregados como sempre, no amor do Senhor. É sempre o amor do Senhor que nos reúne. Mas hoje temos um motivo especial: motivo que tem a ver com a nossa história. E nós queremos que a nossa história também toque a história de Deus porque a história de Deus quis tocar a nossa história. Nós não faríamos história sem Deus. Tudo começou por causa do amor de Deus. Todos nós e o mundo todo somos expressão do amor de Deus, da benevolência de Deus. Se nós quisermos ver, meio que tateando, Deus precisamos contemplar e aprender a contemplar a maravilha da criação. Ela só nem sempre é bela por causa do nosso pecados, por causa das nossas interferências na obra de Deus. Mas, Deus é bom e tudo o que sai dele é bom. Por isso, que a criação toda é boa; não é má porque é fruto saído das profundezas da bondade do Senhor.
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Se o Santuário falasse a nossa linguagem…
Nós, hoje, estamos aqui celebrando o segundo aniversário da Consagração desta Casa, deste Templo, deste Santuário, Santuário do Pai das Misericórdias. Se esta Casa falasse a nossa linguagem ela poderia, com toda a certeza, nos narrar tantas maravilhas, tantos milagres, tantas vidas refeitas, tantas pessoas perdoadas, que vieram prostradas e saíram de cabeça erguida. Deus tudo percebe, tudo conta e tudo contabiliza. Nós queremos entregar tudo isso nas mãos do Senhor.
Como nós acabamos de ouvir, por vontade ou força humana, nada e nenhuma construção pode conter Deus. A bela oração do rei Salomão nos faz perceber isto, a Palavra de Deus. Por graça e presença misericordiosa, o Senhor quer estar perto da Sua criação e Seus filhos e o Senhor quer habitar no templo do Espírito Santo, que Ele próprio criou, que é o corpo humano, a pessoa humana, toda pessoa humana e sempre, em qualquer situação e já desde a concepção. Por isso, que nós (e quem escreveu um texto belo foi a presidência da CNBB), nós, como Igreja, precisamos recordar Por isso, por causa desse belo fundamento da nossa vida que é Deus, por isso, os senhores Juízes, que legislam que o aborto é crime somente a partir do terceiro mês de gestação, estão muito enganados nas coisas divinas e humanas. Deus mora na pessoa e busca fazer história (e história sagrada), com cada pessoa. Eis a dignidade: dignidade inviolável da pessoa humana e do corpo humano. O Apóstolo Paulo diz e nós ouvimos isso: “Vós sois construção de Deus. Acaso não sabeis que sois santuário de Deus e que o Espírito de Deus mora em vós? Se alguém destruir o santuário de Deus, Deus o destruirá, pois o santuário de Deus é santo, e vós sois este santuário”. É belo perceber, caros irmãos e irmãs, a inteligível percepção que a Palavra de Deus nos informa sobre a pessoa humana, criada à imagem e semelhança do próprio Deus, desde o início da concepção. A criação de Deus não pode ser manipulada a bel prazer. É pecado gravíssimo. E essas pessoas não podem se aproximar do altar.
‘Quão amável, ó Senhor, é vossa casa!’
Ancorados na nossa fé, continuamos a rezar, com Salomão: “Teus olhos, Senhor, estejam abertos noite e dia sobre esta casa, sobre o lugar do qual disseste: ‘Aqui estará o meu nome!’ Ouve a oração que o teu servo te faz neste lugar. Ouve as súplicas de teu servo e de teu povo Israel, quando aqui orarem. Escuta-os do alto da tua morada, do céu, escuta-os e perdoa!” Esta oração é nossa, hoje. Que Deus também escute a todos nós e escute a nossa oração que nós fazemos. Escute a realidade de vida de todas as pessoas que nós citamos nesta Casa, hoje, em outros momentos de celebração. Que Deus unja, que Deus abençoe, que Deus perdoe, que Deus restaure.
Hoje, sobem nossos louvores até o Altíssimo por todas as pessoas que nesse Santuário encontraram a Misericórdia do Pai. E suplicamos: ‘Senhor, que nós, teus servos, que te servimos neste lugar, sejamos instrumentos da tua misericórdia para com os teus filhos, que se abeiram de ti, neste lugar santo. Que os peregrinos deste Santuário possam exclamar: ‘Quão amável, ó Senhor, é vossa casa!’.
Deus está aqui
Na Liturgia do II Domingo do Advento, que celebramos ontem, nós ouvimos: “Convertei-vos, porque o Reino dos Céus está próximo”. Palavras de João Batista que depois Jesus, quando inicia a pregação d’Ele, é esta a primeira frase que Jesus irá dizer, retomando esta frase de João Batista. Todos os profetas tem os olhos fixos no sonho, no Reino dos Céus que é um mundo novo feito de relações boas e felizes; eles percebem o respirar do reino, possível e já iniciado. É hora de ousar. É hora de conversão. O Reino está próximo, se avizinhou. Deus está perto, está aqui. Eis a boa notícia: o grande Peregrino caminhou, o grande Peregrino caminhou, superou distâncias, está muito próximo de nós. Deus está conosco, do nosso lado, envolve-nos.
Vivamos a intimidade da vida de Deus, não por imposição, mas por sedução, não por obrigação, mas por atração.
Jesus é a encarnação de Deus que Se faz íntimo, que Se faz íntimo como um pão na boca, como uma palavra dita ao coração, como um respiro. Isto mesmo: ‘Ele vos batizará com o Espirito Santo’ e vos imergirá dentro do mar de Deus; sereis envolvidos, impregnados da vida mesma de Deus, em cada uma das vossas fibras: sereis íntimos de Deus. Tudo isto acontece com Nosso Senhor, Nosso Senhor conosco. Desde a vinda d’Ele a este mundo, desde quando Ele tocou a nossa carne e começou a viver com a nossa carne. E continua com os sacramentos, de modo muito particular, o sacramento da Eucaristia: quando nós comungamos com fé Nosso Senhor. A presença d’Ele, a presença na hóstia vai pervadindo, vai chegando a cada extremidade da nossa vida, do nosso corpo, do nosso ser, da nossa pessoa. É uma maravilha! Esta maravilha é possível! É o sonho de Deus para nossa vida. O sonho de Deus é Ele poder ser de fato inteiramente nosso e nós possamos nos abrir para viver plenamente a vida de Deus porque Ele sabe que essa é a vida própria nossa, dos filhos e filhas. Vivamos a intimidade da vida de Deus, não por imposição, mas por sedução, não por obrigação, mas por atração. Nosso Senhor é tão atraente, Ele é tão conquistador. E parece que nós somos indiferentes, um tanto secos ou ignoramos. Nosso Senhor como que nos ‘corteja’ por todos os lados. Nosso Senhor é um enamorado para conosco: Ele vai nos rodeando, vai cantando, vai inventando poesias, histórias, parábolas, exemplos… E, quando isso não basta, Ele ainda sobre faz tantos milagres, faz discursos belíssimos sobre Deus. E, quando nem isto nos move, Nosso Senhor, o Santo, ainda Se joga por baixo dos nossos pecados, Se carrega com Eles, e Se oferece por nós na Cruz. Pode alguém fazer mais por uma outra pessoa? Impossível! Nosso Senhor fez tudo por nós. Então, por atração e sedução Nosso Senhor nos trabalha.
‘Convertei-vos!’
Sabemos: o que converte o frio em calor não é uma ordem do alto, mas a proximidade do fogo; o que tira as sombras do coração não é uma proibição ou uma obrigação, mas uma lâmpada que se acende, um raio, uma estrela, um olhar. Convertei-vos! Girai-vos na direção da luz. A luz já está aqui, e convida: mudai de estrada. Nos meus caminhos o céu está mais perto e mais azul, o solo mais fértil, as pessoas são irmãs e irmãos, as árvores fecundas e o mel é doce e tem para todos.
Conversão significa também abandonar tudo o que faz mal às pessoas, e escolher sempre o que humaniza; como Jesus faz: para Ele o único pecado é o desamor, o transgredir um sonho, o sonho grande de Deus por nós.
‘Se conhecesses do dom de Deus’
‘Se conhecesses do dom de Deus’, diz Jesus à Samaritana. Hoje, nesse texto que nós ouvimos um pouquinho antes. “Se conhecesses do dom de Deus” É a frase que embala todo o texto do evangelho que lemos hoje. O dom de Deus é a água viva, ou seja: o amor do Pai e do Filho, que Jesus tem sede de doar a nós. Jesus tem sede de derramar em nossa vida o amor do Pai e o amor d’Ele. Jesus investe toda a vida: é um jarro que vai ao nosso encontro e vai ao nosso encontro; Ele quer derramar o amor do Pai e do Filho dentro de nós para que tenhamos a vida do Pai e do Filho em nós. Para que as pessoas que nos enxergam possam dizer: ‘É filha de Deus, é filho de Deus!’ É só olhar a vida. A mulher reconhece Jesus como profeta e lhe pergunta como encontrar Deus, o Noivo: onde se pode adorá-lo? Jesus lhe anuncia que está junto Dele: é Ele mesmo que lhe fala! Jesus é aquele que sacia e aquele que deve ser adorado. Na adoração, Ele sacia. É sempre bom lembrar que adorar significa levar à boca. Para assimilar e ser assimilado por aquilo que eu adoro. Nós adoramos tanta coisa nesse mundo. As nossas escolhas nos fazem. Por isso, que Jesus veio ao nosso encontro, veio à nossa frente: para que nós pudêssemos adorá-l’O, olhar para Ele, crer, trazê-l’O para dentro da vida e começar a mudar a vida a partir d’Ele. E essa mulher pergunta: ‘onde é que vou adorar Nosso Senhor?’ Jesus é a fonte de água viva, o Esposo que procura a esposa infiel para dar-lhe o seu amor. Nele se cumpre o verdadeiro culto: o amor para com o Pai. Só Deus é o Esposo. De fato, quem pode conter Deus, não pode ser enchido por qualquer coisa, que não seja Deus. Por isso, que estamos meio insatisfeitos, com sede. Santo Agostinho diz que nós procuramos sempre, procuramos, procuramos e só paramos de procurar quando nós encontramos Deus. Porque nós fomos criados para ser abastecidos por Deus, não por outras coisas. A adoração tem a ver com a água e com o Esposo, enquanto é o saciar daquela sede que só o Esposo pode satisfazer.
Consagremos o Santuário e nossa vida ao Pai
O ‘lugar’ onde é preciso adorar é o corpo do Filho do Homem, o novo Templo, o novo Santuário do Senhor, que “era necessário” que fosse elevado, para que dele saísse o Espírito e a água viva, que se torna em cada um de nós fonte borbulhante de amor, amor para com os outros. Aqui se adora em Espírito e verdade, sorvendo, fazendo Daquele que Se entrega a sua própria vida e o seu viver. A casa do Pai é o Filho, é a vida do Filho. O Filho diz: “Quem viu a mim, viu o Pai”. Ao culto Jesus contrapõe aquele do Pai, que já se cumpre no Filho, que se faz irmão de todos. O Pai é a origem da fraternidade: por isto, o seu verdadeiro culto é o recíproco amor entre irmãos (13,34).
Consagremos, ainda hoje, todos nós, estamos consagrando este Santuário ao Pai das Misericórdias, juntamente com nossa vida. Nós somos santuários, templos do Espírito Santo: consagremos também a nossa vida. Que sejamos expressão da identidade de Jesus, como Ele a foi do Pai. Isto é do agrado do Pai e é nosso alimento, como foi alimento de Jesus.
Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo!”