Quantas vezes já não fomos questionados sobre qual é o contrário do amor? E, errônea e imediatamente, respondemos ser o ódio. Bem, isso já aconteceu inúmeras vezes comigo. Ouvi que o correto seria a “indiferença” e, hoje, comungo dessa opinião. O ódio, por pior que seja, diz ainda de uma humanidade existente… Sente-se algo (ainda que ruim) e, portanto, pode-se transformar ou canalizar esse sentimento em algo que seja benéfico.
O ódio diz de um ser humano ferido e decepcionado. Talvez, alguém que tenha depositado todas as forças e confiança no amor dos outros, esquecendo-se que qualquer pessoa é digna de erros e falhas. Às vezes, o ódio a uma causa, por exemplo, diz de um amor – ainda que doentio – a outra causa. Ou de uma tentativa – ainda que errada e desesperada – de ajudar um outro lado.
A indiferença não. Ela contraria o amor porque ela paralisa. Ela é o impedimento dos sentimentos. Ser tomado pela indiferença é ter os olhos vendados. Seria como passar por uma criança em situação de miséria e não se comover. Olhar pais que perdem um filho assassinado e não se compadecer. Ver uma mulher abusada e não rezar para que ela consiga passar por isso. É conformar-se com tudo, sob a premissa de que “Deus quis”, quando é Ele mesmo quem nos ordena: “Não vos conformeis com este mundo” (Rm 12,2).
A inconformidade diz de um amor que é ativo. Que dá visão espiritual sobre todas as coisas. O amor – o verdadeiro – permite que saiamos de nós mesmos. E isto nos coloca no princípio e fim da vida humana: configurar-se ao Cristo. Leva-nos a uma espiritualidade profunda e verdadeira.
Neste mesmo âmbito espiritual, a indiferença é o escurecer dos caminhos a serem seguidos. Se não sinto ofender a Deus, jamais alcançarei o dom de temê-Lo. Se sou indiferente à Sua presença, nunca vou ao Seu encontro. Se sou indiferente ao Seu Corpo, por que iria à missa? Se sou indiferente ao pecado, por que não me deleitar nos meus prazeres e vontades? A indiferença que mata a si mesmo e ao próximo.
Nos tempos em que vivemos de tantas dores e perdas, se nos deixarmos tomar pela indiferença, perderemos a nossa própria essência: sermos gente! Pessoas que sentem, que se compadecem, que choram juntas, que rezam juntas. Se nós nos esquecermos de quem somos, andaremos como cegos.
A única indiferença positiva – se é que posso escrever desta forma – é a descrita pelo meu amado Santo Inácio de Loyola. A “Indiferença Ativa” não é falta de amor ou insensibilidade. É um amor ordenado, livre de todas as nossas paixões desordenadas quanto as coisas criadas, para em tudo fazermos a vontade de Deus.
Rezemos para que não sejamos cegos. Para que nossos corações jamais sejam tomados pela indiferença, de tal forma que o nosso exemplo possa retirar as vendas dos olhos dos que ainda precisam ser alcançados pelo amor salvífico e transformador de Cristo.
Catarina Xavier
Comunidade Canção nova
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