Segundo Santo Tomás de Aquino, a fé cristã tem três fontes essenciais: a Santíssima Trindade, a criação do mundo e a encarnação do Filho de Deus. E, hoje, a Liturgia, nos convida não só a admirar, mas adorar a Trindade Santíssima.
Trindade é uma palavra inventada pelos pensadores cristãos, os teólogos, que significa que as Três Pessoas divinas estão, de tal modo, unidas entre si, que não foram três deuses, mas um único Deus. Não existe uma comunhão mais perfeita e bela como essa! De modo que, Trindade significa que Deus é comunhão, Deus é amor — como escreveu São João, em sua primeira carta.
E foi Jesus quem nos revelou essa maravilha: a existência da Santíssima Trindade. E só Ele poderia fazer isso porque Deus é o grande mistério. Só Deus conhece a Deus.
No capítulo 11, do Evangelho de São Lucas, Jesus diz: “Ninguém conhece o Filho senão o Pai; e ninguém conhece o Pai a não ser o Filho, e aquele a quem o Filho o desejar revelar”. Portanto, só Jesus, o Filho de Deus, poderia nos dizer, de modo definitivo e pleno, quem de fato é Deus.
O povo de Israel, em toda a sua história, cometeu um grande pecado: a idolatria. Adorou um bezerro de metal, feito por mãos humanas. Como afirma a Sagrada Escritura, ao invés de adorar um Deus vivo e verdadeiro, que o havia libertado da escravidão do Egito, adorou a imagem de um animal que come capim.
A humanidade precisa, de certo modo, ser imagem da Santíssima Trindade
Quando Moisés desceu do alto da montanha com as duas tábuas de pedra, nas quais estavam gravados os Dez Mandamentos, símbolo da aliança de Deus com Seu povo, ele contemplou aquele espetáculo terrível. O povo dançando e adorando a imagem de um bezerro de metal.
Moisés, então, quebrou as duas tábuas de pedra ao pé da montanha. Quebrou porque o povo com aquela idolatria havia quebrado a aliança que Deus havia feito com ele, havia profanado a aliança. Mas Moisés era o intercessor do povo junto de Deus, e ele intercede pelo povo para que Deus não destrua o seu povo. E, assim, Deus ouviu a prece de Moisés; perdoou ao povo.
Em seguida, Moisés sobe ao alto da montanha — conforme vimos na Primeira Leitura —, e pede a Deus que lhe mostre o seu rosto.
O rosto de Deus
Deus não mostrou a Moisés visivelmente o Seu rosto, mas apresentou o seu rosto através de três traços, três palavras muito bonitas: misericórdia, graça e fidelidade.
O modo de pensar de Deus, a lógica d’Ele é diferente da lógica humana. A lógica humana é racional, legalista e fria. “Quem erra, quem peca deve pagar”, mas a lógica de Deus não é a lógica da razão fria. É a lógica do coração e da misericórdia.
Misericórdia significa que Deus tem o coração voltado para as misérias dos seres humanos. Essa é a lógica de Deus, é o modo d’Ele pensar.
É bem verdade que em Deus também existe a justiça, mas ela está sempre articulada com a misericórdia. Na realidade, em Deus a misericórdia supera a justiça.
Outro traço do rosto divino de Deus: a graça. Deus tem o primado em tudo, todos os dons que nós recebemos veio d’Ele, por isso mesmo o Seu amor transborda para fora e derrama sobre nós as Suas graças e os Seus dons, mas Deus é também fidelidade — é o terceiro traço do rosto divino de Deus. Mesmo quando somos infiéis ao amor de Deus e pecamos, Ele permanece fiel no Seu amor para conosco.
O título de Pai
O Antigo Testamento atribui também a Deus o título de Pai. Atribui esse título porque Ele é o criador de tudo que existe; Ele fez aliança com o povo de Israel, mas Jesus nos revelou a novidade da paternidade de Deus.
Para Jesus, Deus é Pai não simplesmente porque é o Criador de tudo que existe, não simplesmente porque fez aliança com o povo de Israel. Deus é Pai porque, desde toda a eternidade, Ele possui o Filho que é Jesus. Portanto, Jesus é na verdade o revelador do Pai.
Ouvimos no Evangelho: “Deus tanto amou o mundo que nos entregou o Seu Filho único”. Na encarnação do Seu Filho, Deus tornou-se visualmente presente no mundo, Ele se mostrou visivelmente ao mundo. Deus interpretou e disse quem Ele era. Por isso Jesus disse ao apóstolo Filipe: “Quem me vê, vê o Pai”.
Se queremos ver a face de Deus, Moisés não conseguiu, mas nós podemos. Olhemos para o rosto de Jesus. Se queremos escutar a voz de Deus, ouçamos a Palavra de Jesus. Se queremos caminhar até Deus, sigamos a Jesus.
A terceira beleza: o Espírito
Como afirma São Paulo na carta aos Colossenses: “Ele é a imagem visível do Deus invisível”. Mas Jesus nos revelou uma terceira beleza: o Espírito Santo.
No Antigo Testamento, já encontramos essa palavra: Espírito, mas o Antigo Testamento não concebe o Espírito como pessoa, e sim como uma força divina que opera e faz operar. Como afirma o profeta Ezequiel: “O Espírito é essa força divina que mantém o profeta de pé e é preciso coragem para anunciar a Palavra de Deus”.
Mas Jesus nos revelou, no Antigo Testamento, que esse Espírito — que era considerado força divina —, é na realidade uma pessoa. Por isso mesmo, na última ceia, Ele afirma que depois que partir desse mundo, Ele vai pedir ao Pai que envie um ao outro Paráclito, alguém igual a Ele mesmo. Esse outro é um pronome pessoal, em grego, que significa que o Espírito Santo é pessoa. É alguém igual a Jesus em dignidade e valor.
Esse Paráclito — Espírito – Pessoa —, que Jesus prometeu, significa três coisas. Paráclito é um vocábulo da língua grega, que significa: defensor, advogado. E Jesus insistiu muito, durante o ministério público, nessa missão do Espírito: defender.
Por isso, Ele disse: “Quando comparecem diante dos tribunais, forem caluniados e denunciados, não procurem um advogado, pois o Espírito Santo será o advogado e o defensor de vocês”.
O Espírito Santo nos defende daqueles que nos caluniam, nos perseguem de um modo que só Ele sabe fazer. O Espírito age no coração da pessoa que ofende, calunia e persegue para mudar o seu coração, para converter o seu coração. Só o Espírito Santo é capaz de realizar isso!
Paráclito significa também “consolador”. A consolação é um ato muito humano e bonito. Ela não diminui o sofrimento, mas o suaviza.
Segundo o quarto Evangelho, Deus Pai enviou um anjo no Horto das Oliveiras, para consolar e suavizar os sofrimentos de Jesus. Portanto, nas horas de sofrimento, seja o sofrimento físico, que é o sofrimento do corpo; seja o sofrimento moral, que é o da alma; uma incompreensão, uma calúnia, por exemplo, recorramos ao Espírito Santo, pois Ele é o Paráclito, aquele que suaviza o nosso sofrimento.
O Espírito nos socorre
No capítulo 8, da Carta aos Romanos, São Paulo escreve: “Não sabemos orar”. O Espírito Santo veio em socorro da nossa fraqueza. E, de fato, é o Espírito Santo que desperta no coração da pessoa o desejo de orar. A oração é dom de Deus e do Espírito Santo.
Enquanto oramos, o Espírito plasma a nossa afetividade, o nosso pensamento, Ele coloca em nossa boca as palavras que devemos dirigir ao Pai. Portanto, o grande dom da oração, a graça da oração é fruto da presença do Espírito Santo em nós.
Nesta celebração tão bonita da Santíssima Trindade, podemos tirar algumas conclusões práticas para a nossa vida. Trindade significa que Deus é o fundamento, tudo tem início n’Ele; Ele é o fundamento do Universo.
O Papa Bento XVI, referindo-se ao esforço da ciência para explicar a origem do universo afirmou: “Sem Deus, as coisas não se fecham; sem Ele não explicamos a origem do universo”. Deus é o fundamento mais profundo da moral, da reta conduta humana.
A vida fundamentada em Deus
Por isso, quando a pessoa faz de conta que Deus não existe, decide levar a vida por conta própria, a porta fica aberta para os maiores males, mas, sobretudo, Deus é o fundamento da nossa vida. Uma vida sem Deus, é uma vida vazia e sem fundamento.
Deus não criou a humanidade para viver em conflito, em revoluções e guerras. Deus que é Trindade, que é comunhão e amor, criou os seres humanos para o amor e para a fraternidade. Por isso mesmo, a humanidade precisa, de certo modo, ser imagem da Santíssima Trindade.
O Papa Francisco, na sua Encíclica tão bela, Fratelli Tutti (“Todos irmãos”), afirma que a igualdade e a liberdade não conseguem promover a vida democrática. Sem fraternidade também não existe vida democrática. Como isso é importante para o momento que vive o Brasil. Para que haja verdadeira democracia, segundo o Papa, é necessária também a fraternidade.
A Segunda Leitura desta missa, serve como conclusão para a nossa reflexão. São Paulo termina a sua segunda carta à comunidade de Corinto, sua comunidade predileta, com uma saudação trinitária: “A graça de nosso Senhor Cristo, o amor do Pai e a comunhão do Espírito Santo estejam convosco”. Paulo quer recordar que a Igreja é a Igreja da Trindade.
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Paulo quer recordar que o modelo para a comunhão da Igreja é a Santíssima Trindade. A comunhão eclesial não é fruto de um esforço voluntarista, é comunhão na graça, é imitando a comunhão perfeita das Três Pessoas divinas que a Igreja também constrói a comunhão.
A saudação trinitária de Paulo, mostra que aquilo que dá identidade à Igreja é a presença da Santíssima Trindade, que habita na Igreja e em cada membro dela. De modo, que a Igreja é o templo aqui na terra da Santíssima Trindade.
Todas as nossas celebrações litúrgicas, se realizam em nome da Trindade. Iniciamos a celebração litúrgica — Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Diversas vezes, durante as celebrações litúrgicas, dizemos: Glória ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo. E, no final da celebração da Eucaristia, o celebrante envia toda a comunidade em missão, abençoando-a em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. É a Santíssima Trindade presente na Igreja que é o templo, e toda a nossa vida está envolvida pela Santíssima Trindade.
Transcrição e adaptação: Karina Silva