DOM ALBERTO TAVEIRA

Não desvie o rosto de nenhum pobre

‘Todas as vezes que fizestes isso a um destes meus irmãos mais pequeninos, foi a Mim que o fizestes!’

O magnífico texto do Livro de Tobias traz um verdadeiro testamento do pai Tobit, dirigido ao filho Tobias, de onde, em feliz inspiração, o Papa extraiu o título do Sétimo Dia Mundial dos Pobres, celebrado no penúltimo domingo do Ano Litúrgico, abrindo os nossos corações para a verdadeira vigilância, tema deste período litúrgico, preparando-nos para o compromisso a ser assumido de novo, na Solenidade de Cristo Rei, de acolhermos e ao mesmo tempo construirmos o Reino de Deus. Eis as palavras da Escritura: “Em todos os teus dias, filho, tem o Senhor na tua mente, e não consintas em pecar, nem em transgredir os seus mandamentos. Pratica a justiça todos os dias de tua vida e não sigas os caminhos da iniquidade. De fato, se praticares a verdade serás bem-sucedido em teus empreendimentos, como o serão todos os que praticam a justiça. Dos teus bens, filho, dá esmola, e não desvies o rosto de nenhum pobre, para que de ti não se desvie a face de Deus. Segundo o que tiveres, conforme a importância dos teus bens, dá a esmola. Se tiveres pouco, não receies dar a esmola desse pouco. Assim garantes, para ti, um prêmio valioso no dia do infortúnio. Pois a esmola livra da morte e não deixa ir para as trevas” (Tb 4,5-10). Aqui está o convite do Papa: “No domingo que antecede a festa de Jesus Cristo, Rei do Universo, reunimo-nos ao redor da sua Mesa para voltar a receber dele o dom e o compromisso de viver a pobreza e servir os pobres”.

“O rico ou o pobre pode praticar a virtude da pobreza revendo seus armários, gavetas, bolsos e contas bancárias, para doar do seu supérfluo e até do seu necessário, lançando-se confiantes nos braços e no coração da Providência!” | Foto ilustrativa: Yandry Fernández Perdomo via Cathopic

Durante vários meses, a nossa Arquidiocese tem se preparado para viver esta Jornada convocada pelo Santo Padre, e agora nós a celebramos com intensidade, buscando conhecer o que fazemos juntos para servir concretamente os pobres, revisar as nossas falhas, olhar para frente e comprometermo-nos mais ainda com a caridade, a única riqueza que haveremos de levar, quando chegar o dia de nossa Páscoa pessoal na morte.
Há que assumir o compromisso de viver a pobreza. Este é um apelo do Evangelho para todos, pobres, remediados, ricos ou muito ricos, de todas as profissões, idades e estados de vida. Trata-se de um Conselho Evangélico (Cf. Lc 14,25-35), não no sentido de uma piedosa recomendação, mas um chamado e exigência que o Senhor dirigiu às multidões, a todos! Devemos aprender com o próprio Deus. Deus é pobre, porque tem tudo e dá tudo! Deus é amor, e o amor é livre, paciente, criativo, pensa nos outros, despoja-se de si. O grande gesto de pobreza foi dar o seu Filho Único, que se fez pobre, sem apegar-se à sua igualdade com Deus, tornando-se escravo, obediente até a morte, e morte de Cruz.

Mas podemos fazer a pergunta a qualquer pessoa, e até ser os próprios interlocutores, sobre a forma de praticar a virtude da pobreza. Desapego é a primeira palavra. Saber utilizar os bens, mas não viver para os bens. E lá mesmo, perto de nós, até com bolsos vazios, dá para ser mais pobres segundo o Evangelho superando o sonho de consumo, que pode até fazer repletos os últimos dias de novembro, com liquidações, muitas vezes enganadoras, até com nome em outra língua, para ficar mais atraente. O rico ou o pobre pode praticar a virtude da pobreza revendo seus armários, gavetas, bolsos e contas bancárias, para doar do seu supérfluo e até do seu necessário, lançando-se confiantes nos braços e no coração da Providência!

Leia também:
:: Cair em si para voltar para o Pai
:: Qual o significado dos sacramentais na vida cristã?
:: O amor que dá avida! Martírio de São Maximiliano Kolbe

Para ampliar estes gestos, o Papa recorda Santa Teresinha do Menino Jesus: “Compreendo agora que a caridade perfeita consiste em suportar os defeitos dos outros, em não se escandalizar com as suas fraquezas, em edificar-se com os menores atos de virtude que se lhes vir praticar; mas compreendi, sobretudo, que a caridade não deve ficar encerrada no fundo do coração: ‘Ninguém acende uma lâmpada para a colocar debaixo do alqueire, mas coloca-a sobre o candelabro para alumiar todos os que estão em casa’. Creio que essa luz representa a caridade, que deve iluminar e alegrar, não só os que são mais queridos, mas todos aqueles que estão na casa, sem exceções” (História de uma alma, Ed. Avessadas 2005, 255-256). A esta luz, vale uma recomendação para o Dia Mundial dos Pobres: cada cristão católico encontre e ponha em prática o compromisso de fazer semanalmente um gesto concreto e espontâneo de serviço ao próximo. Pode ser a visita aos doentes e hospitais, a exigente visita aos presídios, a doação de alimento ou dinheiro aos mais pobres, ou ir à procura de alguém do qual se virou o rosto para outro lado, e daí por diante! Olhar ao nosso redor, para que ninguém passe em vão ao nosso lado! É um passo possível e acessível a todos.

Viver o Dia Mundial dos Pobres significa ainda conhecer e comprometer-se com as iniciativas da Igreja no serviço social e na promoção humana. Estamos trabalhando seriamente para que cada Paróquia da Arquidiocese tenha seu Núcleo da Cáritas Arquidiocesana, aos quais cabe a organização da caridade em cada área. E, pouco a pouco, a síntese do Ministério dos Diáconos Permanentes vai se tornando a caridade e o serviço dos pobres, para que sejam eles guardiães a nos recordarem continuamente esta vocação da Igreja. São muitas as Obras Sociais e de serviço a serem conhecidas e com elas se comprometam os cristãos, com atenção aos moradores de rua, toxicodependentes, crianças. E o quanto a Igreja tem feito através das Escolas Católicas em todos os níveis! E será que todos conhecem as Comunidades Religiosas inseridas nas áreas mais pobres de nossa Arquidiocese, animando as Comunidades Eclesiais Missionárias e as Comunidades Eclesiais de Base?

Com a palavra, o Papa Francisco: “Que a nossa solicitude pelos pobres seja sempre marcada pelo realismo evangélico. A partilha deve corresponder às necessidades concretas do outro, e não ao supérfluo de que me quero libertar. Aqui é preciso discernimento, sob a guia do Espírito Santo, para distinguir as verdadeiras exigências dos irmãos do que constitui as nossas aspirações. Aquilo de que têm urgente necessidade é da nossa humanidade, do nosso coração aberto ao amor. Não esqueçamos: ‘Somos chamados a descobrir Cristo neles: não só a emprestar-lhes a nossa voz nas suas causas, mas também a ser seus amigos, a escutá-los, a compreendê-los e a acolher a misteriosa sabedoria que Deus nos quer comunicar através deles’ (Evangelii gaudium, 198). A fé ensina-nos que todo o pobre é filho de Deus e que, nele ou nela, está presente Cristo: ‘Todas as vezes que fizestes isso a um destes meus irmãos mais pequeninos, foi a mim que o fizestes!’ (Mt 25, 40 – Cf. Mensagem para o Dia Mundial dos Pobres, 9).

Deixe seu comentários

Comentário