DEVOÇÃO REPARADORA

A relação do sexto Mandamento com a Mensagem de Fátima

Não cometerás adultério

A grande preocupação de Nossa Senhora demonstrada em suas aparições em Fátima, Portugal, foi a salvação do homem e, por isso, trouxe em sua mensagem um veemente apelo à conversão, mostrando que esta deve ser alcançada por meio da oração e da penitência – compreendida como sacrifícios voluntários e involuntários – oferecidos a Deus em espírito de reparação.

No núcleo central de sua mensagem, ela exorta: “Não ofendais mais a Deus Nosso Senhor que já está muito ofendido” (IRMÃ LÚCIA, 2015, p.181), advertindo, deste modo, o gênero humano a lutar contra o pecado, sobretudo, aqueles que levam à morte, que podem ser vistos na não observância dos Mandamentos do Decálogo.

Com efeito, o Magistério da Igreja reconheceu a Mensagem de Fátima como um verdadeiro contributo para o mundo contemporâneo no que tange à urgência da conversão do gênero humano. Neste sentido, o Papa São João Paulo II, por ocasião do 80º aniversário da primeira aparição de Nossa Senhora em Fátima, afirmou: “A mensagem que naquela ocasião a Virgem Santíssima dirigiu à humanidade, continua a ressoar com toda a sua força profética, convidando a todos à constante oração, à conversão interior e a um generoso empenho de reparação dos próprios pecados e daqueles de todo o mundo”. E o Papa Bento XVI, em sua homilia do dia 13 de maio de 2010, por ocasião de sua visita à Fátima, também afirmou a atualidade da profecia trazida pela Santíssima Virgem: “Iludir-se-ia quem pensasse que a missão profética de Fátima esteja concluída”.

Nesta ótica, pode-se constatar que o conteúdo trazido por Nossa Senhora em suas aparições possuem uma dimensão eclesial, uma vez que a Igreja, como corpo místico de Cristo, possui um caráter reparador permanente. Com efeito, a oração e a penitência pedidas pela Santíssima Virgem evidenciam essa dimensão eclesial, pois nos une a Cristo, cabeça da Igreja que deu a vida em reparação pelos pecados da humanidade e, em sua pregação, foi o primeiro a apontar o caminho da conversão e da penitência: “Completou-se o tempo e o Reino de Deus está próximo; fazei penitência e crede no Evangelho” (Mc 1,15).

Para uma maior compreensão desta Mensagem, a Irmã Lúcia, que viveu até os 97 anos, e está atualmente em processo de beatificação, escreveu uma obra intitulada “Apelos da Mensagem de Fátima” a fim de explicitar o profundo sentido das palavras proferidas pela Santíssima Virgem. É com base nestes escritos nos quais ela expressa a importância da prática dos dez Mandamentos da Lei de Deus, que o presente artigo encontra os seus fundamentos.  Para colocar em relevo a necessidade de praticar o sexto Mandamento: “Não cometerás adultério”, ela parte da Sagrada Escritura com os seguintes termos:

Nestes tempos em que a sociedade parece ter querido fazer deste pecado uma lei, a Sagrada Escritura continua repetindo o mandamento de Deus: ‘Não cometerás adultério’. É Palavra de Deus, e a Palavra de Deus não muda, como não muda a Sua Lei: ‘É mais fácil que o céu e a terra passem do que cair um só til da lei’. (Lc 16,17). Este preceito obriga-nos a todos, cada um segundo o seu estado, a guardar a castidade. (IRMÃ LÚCIA, 2007, p. 238).

Neste sentido, a Irmã Lúcia destaca primeiramente a obrigação de guardar a castidade no estado matrimonial, evidenciando que, para a vivência desta vocação, este valor deve ser salvaguardado antes mesmo de contraí-lo, pois somente assim a bênção de Deus se torna uma realidade presente na vida do casal. Recorda que esta é uma união instituída por Deus já nos inícios da criação quando disse: “Deus criou o homem à sua imagem, à imagem de Deus ele o criou, homem e mulher os criou. Deus os abençoou e lhes disse: ‘Sede fecundos, multiplicai-vos, enchei a terra e submetei-a’” (Gn 1,27-28).

Salienta que esta união se trata de um vínculo indissolúvel estabelecido pelo Criador desde o princípio: “Por esse motivo, o homem deixará o pai e a mãe para se unir à sua mulher; e os dois serão uma só carne” (Gn 2,24). Por conseguinte, destaca a confirmação de Jesus a este respeito quando foi interrogado pelos fariseus acerca do divórcio, a fim de pô-lo a prova: “Foi devido à dureza do vosso coração que ele vos deu essa lei; […] Não separe, pois, o homem o que Deus uniu” (Mc 10, 5.9).

Também destaca outros ensinamentos de Jesus Cristo sobre esta realidade: “Todo o que abandonar sua mulher e casar com outra, comete adultério; e quem se casar com a mulher rejeitada, comete adultério também” (Lc 16,18). E ainda: “Ouvistes que foi dito aos antigos: Não cometerás adultério. Eu, porém, vos digo: todo aquele que lançar um olhar de cobiça para uma mulher, já adulterou com ela em seu coração” (Mt 5,27-28).

Nesta perspectiva catequética, convém salientar que a Igreja, consciente de que o matrimônio e a família constituem “o fundamento da sociedade” (Gaudium et Spes, 52), faz chegar a sua voz a todos os povos e oferece a sua ajuda para que busquem vivê-lo coerentemente.  Assegura que “esta doutrina, muitas vezes exposta pelo Magistério, está fundada sobre a conexão inseparável que Deus quis e que o homem não pode alterar por sua iniciativa, entre os dois significados do ato conjugal: o significado unitivo e o significado procriador.” (Humanae Vitae, 12).

O Magistério coloca ênfase na necessidade da fidelidade conjugal, ao recordar que o autêntico amor conjugal assumido no amor divino é dirigido e enriquecido pela força redentora de Cristo que o elevou a Sacramento e assim fortalece os esposos na sublime missão de pai e de mãe ajudando-os a avançar sempre mais na mútua santificação que os torna cooperadores da glória de Deus. (Gaudium et Spes, 48). Sobretudo, lembra que todo batizado é chamado a viver a castidade a exemplo de Cristo (Gl 3,27), conforme o seu específico estado de vida.

A castidade há de distinguir as pessoas segundo os diferentes estados de vida: umas, na virgindade ou no celibato consagrado, maneira eminente de se dedicar mais facilmente só a Deus, com um coração não dividido; outras, da maneira que determina para elas a lei moral, conforme forem casados ou celibatários. Entretanto, em todo e qualquer estado de vida a castidade não se reduz a uma atitude exterior; ela deve tornar puro o coração do homem, segundo aquelas palavras de Cristo: ‘Ouvistes o que foi dito: Não cometerás adultério. Eu, porém, digo-vos: todo aquele que olhar uma mulher com mau desejo, já cometeu adultério com ela em seu coração’. (DECLARAÇÃO PERSONA HUMANA,11).

Sendo a castidade comandada pela virtude cardeal da temperança (CIC 2341), vale evidenciar que esta virtude precisa ser exercitada pelo contínuo domínio de si, amparado pela oração e pela penitência pedidas pela Santíssima Virgem para o fortalecimento do espírito e em reparação dos pecados. Tendo em conta que este é um exercício que precisa de todo o empenho no caminho de santidade, merecem relevo as palavras da santa Jacinta dirigidas à Madre Godinho na ocasião do tratamento de sua doença em Lisboa: “Os pecados que levam mais gente para o inferno são os pecados da carne.” (MARCHI, 1996, p. 335).

Formada na escola de Maria, ela deixou um grande testemunho de vida ofertada a Deus sendo-lhe fiel na observância de seus mandamentos e mostrando a responsabilidade que toca a cada um de nós, no dever de cumpri-los. Efetivamente, este é um dos principais objetivos da Mensagem de Fátima, conforme afirmou a Irmã Lúcia na última obra que escreveu com o título “Como vejo a Mensagem”.

Um dos principais motivos desta mensagem é levar-nos a uma melhor compreensão dos Mandamentos da Lei de Deus, da sua importância, do seu valor e da nossa responsabilidade, perante o dever que temos de observá-los com fidelidade e amor, na terra e a felicidade na vida eterna. (IRMÃ LÚCIA, 2007, p. 20).

Assim sendo, pode-se constatar que esta mensagem aponta para uma centralidade de Deus na vida do crente, chamado a Nele crer, esperar e amar, sobretudo, testemunhando a pureza nos afetos e nas intenções, para glorificá-lo em toda a sua conduta. Este será o tema da catequese que acontecerá na Devoção Reparadora dos Cinco Primeiros Sábados no Santuário do Pai das Misericórdias no próximo dia 01 de maio de 2021 com início às 10h.

Convidamos você a participar deste momento mariano que será transmitido pelas redes sociais do Santuário (Facebook e Instagram). Deste modo, cresceremos na compreensão e na prática dos Dez Mandamentos, que nos permitem dar a Deus e ao próximo o amor que lhes é devido. 

 

Áurea Maria,
Comunidade Canção Nova

 

Referências

BENTO XVI. Homilia do Papa Bento XVI por ocasião de sua visita à Fátima em 13 de maio de 2010. 10 maio 1997. Disponível em: http://www.vatican.va/content/john-paul-ii/pt/letters/1997/documents/hf_jp-ii_let_19970512_fatima-80.html. Acesso em: 25 de abril de 2021.

BÍBLIA de Jerusalém. Tradução de Euclides Martins Balancin et al. São Paulo: Paulus, 2002.

CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA. Tradução da Conferência nacional dos Bispos do Brasil. 10. ed. São Paulo: Loyola, 2000.CONGREGAÇÃO

PARA A DOUTRINA DA FÉ. Declaração Persona Humana: Sobre alguns pontos de ética sexual. 29 dez. 1975. Disponível em: https://www.vatican.va/roman_curia/congregations/cfaith/documents/rc_con_cfaith_doc_19751229_persona-humana_po.html.  Acesso em: 25 de abril de 2021.

CONSTITUIÇÃO PASTORAL Gaudium et Spes sobre a Igreja no mundo atual. In: COMPÊNDIO DO VATICANO II: constituições, decretos, declarações. 31. ed. Petrópolis: Vozes, 2016. p.141-256.

IRMÃ LÚCIA. Apelos da Mensagem de Fátima. 4. ed. Fátima – Portugal: Secretariado dos Pastorinhos, 2007.

IRMÃ LÚCIA. Como vejo a Mensagem. 2. ed. Fátima – Portugal: Secretariado dos Pastorinhos, 2007.

IRMÃ LÚCIA. Memórias da Irmã Lúcia. 17. ed. Fátima – Portugal: Fundação Francisco e Jacinta Marto, 2015.

JOÃO PAULO II. Mensagem do Papa João Paulo II por ocasião do 80º aniversário da primeira aparição de Nossa Senhora em Fátima. 10 maio 1997. Disponível em: http://www.vatican.va/content/john-paul-ii/pt/letters/1997/documents/hf_jp-ii_let_19970512_fatima-80.html. Acesso em: 25 de abril de 2021.

MARCHI, João. Era uma Senhora mais brilhante que o sol. 20. ed. Fátima – Portugal: Editora Missões Consolata, 1996.

PAULO VI. Carta Encíclica Humanae Vitae. 25 jul. 1968. Disponível em: http://www.vatican.va/content/paul-vi/pt/encyclicals/documents/hf_p-vi_enc_25071968_humanae-vitae.html. Acesso em: 25 de abril de 2021.

 

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