Recordo-me de um acontecimento em minha infância. Estávamos eu e meus pais em uma perfumaria, numa manhã de domingo. Eu era bem pequena. Na minha curiosidade e inquietação, comecei a mexer nas prateleiras e, em pouco tempo, havia deixado cair um frasco de perfume. Eu fiquei tão envergonhada! Papai teria de pagar pelo meu erro. E ele o fez: pagou.
O que ficou mais fortemente gravado em minha memória, no entanto, foi que ele me pegou. Meu pai me pegou no colo. E ali eu me senti assegurada, até de mim mesma. Pelo simples fato de que ele me deixou esconder no seu peito e me permitiu ser filha.
Aprendi o meu relacionamento com o Pai, a partir do que eu sempre vivi com meu pai terreno: esse correr para seus braços, independentemente do que eu fazia. Meu pai sabe quem eu sou, para além do que faço. Eu não sei como é a sua relação com a figura paterna. Mas de uma coisa eu tenho certeza, ainda que você não admita: têm dias que tudo o que queremos é correr para um colo seguro, onde nós só precisamos ser filhos, e nada mais.
Acredito firmemente que ninguém é feliz diante dos próprios erros. Não mesmo. Tanto é assim que, muitas vezes, a tendência é se afundar mais a cada erro cometido. Afinal de contas, lidar com o fato de querer acertar e não conseguir é frustrante. E se recuperar das próprias frustrações sozinho não é tarefa fácil. Eu não queria ter quebrado aquele perfume. Mas eu mexi muito mais do que deveria. Não queremos errar, porém, vamos muito além do que deveríamos. Arriscamos demais, ultrapassamos nossas forças humanas e, quando percebemos, o Pai se coloca a pagar o que danificamos.
Percebo que o maior dano é sempre em nós. Quebramo-nos constantemente em nossas faltas. Quando crianças, era-nos fácil errar e correr para quem nos segurasse. Hoje, adultos, esquecemo-nos que ainda somos filhos e queremos arcar com nossos erros por nós mesmos. Doce ilusão. O que paga as falhas, é quando somos pegos no colo e entendemos: nada nesse mundo é capaz de nos fazer órfãos. A não ser, nós mesmos.
Humanamente, acertos nos fazem felizes e nos trazem o sentimento de dignidade. Assumimo-nos, então, como filhos amados. Faltas nos fazem miseráveis e indignos. Corremos, então, do Pai, quando é para Ele que mais deveríamos ir. Temos a má postura de medirmos o amor de Deus a partir da nossa capacidade de amar.
A verdade? É inútil tentar mensurar o que jamais conseguiríamos. Ainda que em uma vida inteira, errássemos e voltássemos ao Pai, vendo e sentindo tal amor, no fim não saberíamos dizer como isso se dá. Meu conselho? Sejamos filhos!
Esforcemo-nos por não quebrar mais perfumes. Caso aconteça, deixemos que o Pai junte os nossos cacos e nos reconstrua. Ou melhor, transformemos nossos erros em louvor a Deus. Empreguemos a nossa vida em derramarmos perfumes aos pés do Cristo, como Maria o fez (João 12, 3).
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Catarina Xavier
Comunidade Canção Nova