É urgente levar o Cristo ressuscitado para todas as pessoas, ambientes, realidades
Estamos vivendo o mês de outubro, dedicado a mais profunda reflexão acerca do ser missionário, que todos nós somos convidados a assumir. Assumir exprime, em primeiro lugar, trazer para si uma reflexão e, posteriormente, colocar em prática. E, nos tempos em que hoje vivemos, tal prática se torna urgente.
Estar pronto para a missão significa não perder tempo. É urgente levar o Cristo ressuscitado para todas as pessoas, ambientes, realidades. E, nesse sentido, o testemunho é o modo mais eficaz para que a missão de evangelizar, de fato, aconteça.
Este anseio de levar a alegria da vida nova em Cristo se expressou de forma concreta na vida de Nossa Senhora. Ela que, ao tomar conhecimento por meio do Anjo que seria a Mãe do Salvador, não perdeu tempo de ir ao encontro de sua prima Isabel, que também estava grávida, a fim de servir e levar a alegria do Cristo que trazia em seu ventre.
Movidos pelo mesmo anseio de servir, de estar à disposição do nosso irmão e levar a vida nova que Cristo nos veio trazer, sejamos do mesmo modo arautos do amor, por meio da missão que o próprio Senhor nos confia.
Partiu apressadamente – Igreja em saída
Tomemos o trecho do Evangelho que relata o momento em que Maria vai ao encontro de sua prima Isabel:
“Então disse Maria: ‘Eis aqui a serva do Senhor. Faça-se em mim segundo a tua palavra!’ E o anjo afastou-se dela. Naqueles dias, Maria se levantou e foi às pressas às montanhas, a uma cidade de Judá. Entrou em casa de Zacarias e saudou Isabel. Ora, apenas Isabel ouviu a saudação de Maria, a criança estremeceu no seu seio; e Isabel ficou cheia do Espírito Santo.” (Lc 1, 38-41)
Maria foi surpreendida pelo anúncio do Anjo Gabriel. Não esperava por uma missão tão grande, tão nobre: ser mãe do Salvador. Sim, porque se tratava verdadeiramente de uma missão. Por vezes, não somos capazes de compreender, no primeiro momento, aquilo que Deus nos inspira, e até mesmo nos ordena a realizar, seja uma missão ou quando se trata de uma vocação específica. Quando olhamos para a nossa humanidade ferida e limitada, nos deparamos com a incapacidade de corresponder e de levar à frente aquilo que Deus nos confia. Assim foi com a Virgem Maria. Ela também não tinha a totalidade da compreensão. Em alguns momentos nos Evangelhos, vemos a sua postura frente às suas interrogações: guardava tudo no seu coração.
Em primeiro lugar, Maria se pôs a refletir. Guardar no coração é verdadeiramente abrir-se ao que Deus nos fala. Acolher com amor, gratidão, coragem e seguir em frente, mesmo sem compreender, mas com a certeza de que Deus está no comando. Maria assim o fez. Mesmo sem saber como seria a sua vida dali para frente, confiou. E confiando, não perdeu tempo, pois assumiu com coragem a sua missão: levar o Cristo que trazia em seu ventre. Levar a alegria, a esperança, a salvação para aqueles que esperavam por este momento sublime. Eis aí a missão de Maria, e eis aí a nossa missão. Maria não se poupou, mesmo diante dos desafios, das dores, pois sabia que não podia ficar parada. E este foi o impulso que moveu Nossa Senhora ao encontro de sua prima Isabel.
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São João Paulo II em sua Encíclica Redemptoris Missio, nos convida a refletir sobre a urgência da missão que precisa ser colocada em prática, principalmente em nossos dias:
“Mas o que me anima mais a proclamar a urgência da evangelização missionária é que ela constitui o primeiro serviço que a Igreja pode prestar ao homem e à humanidade inteira, no mundo de hoje, que, apesar de conhecer realizações maravilhosas, parece ter perdido o sentido último das coisas e da sua própria existência. Cristo Redentor (…) revela plenamente o homem a si próprio. O homem que a si mesmo se quiser compreender profundamente (.. ) deve aproximar-se de Cristo (…).” (RM 2)
Aqui tomamos conhecimento do que se trata quando falamos sobre a urgência da missão e evangelização. Ao mesmo tempo, compreendemos o que moveu o coração e a postura de Nossa Senhora: levar a alegria do Cristo. E como deixa claro São João Paulo II, hoje mais ainda, o mundo carece deste anúncio. O Papa continua a nos falar na Encíclica Redemptoris Missio:
“O número daqueles que ignoram Cristo, e não fazem parte da Igreja está em contínuo aumento; mais ainda: quase duplicou, (…). A favor desta imensa humanidade, amada pelo Pai a ponto de lhe enviar o Seu Filho, é evidente a urgência da missão.” (RM 3)
Maria, sendo também a imagem da Igreja, Aquela que acolhe, que ama com um amor terno de mãe, abre as portas do coração e se dispõe em ir ao encontro. Nesse sentido, a expressão que o Papa Francisco utilizou muito, principalmente no início de seu pontificado, “Igreja em saída”, se adequa perfeitamente à própria missão de Nossa Senhora. Verdadeiramente estamos em tempos em que é necessário sairmos do nosso comodismo, segurança e individualismo e ir ao encontro do outro.
Às vezes, pode parecer algo já “batido”, ou seja, já um assunto desgastado ou que pode ter caído no esquecimento. Porém, Maria nos ensina que o desejo de ir ao encontro, de “pessoa a pessoa”, não pode ser apagado por uma vida missionária relaxada e cômoda. Nesse aspecto, Papa Francisco nos fala em sua Exortação Apostólica Evangelii Gaudium:
“Hoje que a Igreja deseja viver uma profunda renovação missionária, há uma forma de pregação que nos compete a todos como tarefa diária: é cada um levar o Evangelho às pessoas com quem se encontra, tanto aos mais íntimos como aos desconhecidos. É a pregação informal que se pode realizar durante uma conversa, e é também a que realiza um missionário quando visita um lar. Ser discípulo significa ter a disposição permanente de levar aos outros o amor de Jesus; e isto sucede espontaneamente em qualquer lugar: na rua, na praça, no trabalho, num caminho.” (EG 127)
Movida pelo ardor em levar o amor de Cristo à sua prima Isabel, Maria não perdeu tempo e nos ensina a, do mesmo modo, assumirmos sem medo o Cristo que vive em nós e levá-Lo a tantos que precisam fazer a experiência deste amor.
O testemunho e serviço – a missão da Virgem Maria
Além do desejo de levar a alegria do Cristo, o que moveu a missão de Nossa Senhora foi o serviço. Servir a sua prima Isabel, pois estava grávida de João Batista e já era idosa.
Este desejo de servir, infelizmente nos dias de hoje, se encontra esquecido, sufocado pelo individualismo, egoísmo e fechamento do coração humano. Hoje, estamos imersos em uma sociedade que promove o bem-estar, mas de forma egocêntrica, ou seja, a importância de garantir o bem-estar de si próprio, esquecendo-se que, ao nosso lado, existe alguém que está carecendo, seja de auxílio material, mas principalmente de presença. O próprio Cristo revela aos apóstolos na Última Ceia a importância desta face que precisa reger a missão de cada um de nós:
“Vós me chamais Mestre e Senhor, e dizeis bem, porque eu o sou. Logo, se eu, vosso Senhor e Mestre, vos lavei os pés, também vós deveis lavar-vos os pés uns dos outros. Dei-vos o exemplo para que, como eu vos fiz, assim façais também vós. (…) o servo não é maior do que o seu Senhor (…) Se compreenderdes essas coisas, sereis felizes sob a condição de as praticardes.” (Jo 13, 13-17)
Como Jesus declara e testemunha com sua vida de forma concreta, do mesmo modo foi com Nossa Senhora. Imaginamos o quanto foi difícil a viagem que Ela enfrentou para chegar à região montanhosa onde morava Isabel. Mesmo assim, Nossa Senhora não mediu esforços. Jesus, ali na Última Ceia, demonstra com amor a importância de lavar os pés uns dos outros. Nesse singelo, mas profundo gesto, nos ensina que há maior alegria para aquele que serve do que para quem é servido.
De fato, quem nunca experimentou a alegria de ver o rosto de uma pessoa que recebeu da nossa parte um gesto de amor sem esperar nada em troca? Nos alegra o coração porque fomos feitos para amar, para doar-se uns pelos outros. Porém, esbarramos em nossos egoísmos, orgulho, individualismo, quando ao contrário, fomos feitos para os outros.
O mundo carece deste amor livre e doado. Mais uma vez, tomamos a expressão do Papa Francisco, dessa necessidade de sermos uma “igreja em saída”. Estamos cansados de discursos e tantas palavras vazias. Precisamos viver o serviço no amor, na gratuidade. Isso salva pessoas verdadeiramente, e aqui entramos na dimensão do testemunho.
Novamente, São João Paulo II nos fala na Encíclica Redemptoris Missio:
“O homem contemporâneo acredita mais nas testemunhas do que nos mestres, mais na experiência do que na doutrina, mais na vida e nos fatos do que nas teorias. O testemunho da vida cristã é a primeira e insubstituível forma de missão: Cristo, cuja missão nós continuamos, é a ‘testemunha’ por excelência (Ap 1, 5; 3, 14) e o modelo do testemunho cristão.” (RM 42)
A partir do testemunho do próprio Cristo, que viveu o serviço e o amor na vida concreta, o Papa prossegue, trazendo para a nosso papel de missionários:
“A primeira forma de testemunho é a própria vida do missionário, da família cristã e da comunidade eclesial, que torna visível um novo modo de se comportar. O missionário que, apesar dos seus limites e defeitos humanos, vive com simplicidade, segundo o modelo de Cristo, é um sinal de Deus e das realidades transcendentes. Mas todos na Igreja, esforçando-se por imitar o divino Mestre, podem e devem dar o mesmo testemunho, que é, em muitos casos, o único modo possível de se ser missionário.” (RM 42)
Não é possível falar de Nossa Senhora e não sermos imediatamente movidos a contemplar a vida de Cristo. Se falamos do ser missionário de Maria, falamos, ao mesmo tempo, do ser missionário de Cristo. Maria, que trazia dentro de si Jesus, viveu de forma intensa e concreta, tanto o serviço quanto o testemunho. Viveu de forma simples, humilde e profunda, como São João Paulo II declara acima como deve ser.
Conhecemos bem a sociedade que hoje vivemos, seus problemas, e, com isso, corremos o risco de nos fecharmos cada vez mais aos outros. No entanto, a modelo da Virgem e de Nosso Senhor Jesus Cristo, não podemos perder o ardor pelo serviço ao próximo, de sermos verdadeiramente testemunhas do Cristo que habita em cada um de nós. E viver o serviço e testemunho não custa, não requer grandes feitos porque o amor é simples. São João Paulo II conclui dessa forma este tema do testemunho que o missionário deve buscar viver:
“A Igreja e os missionários devem ainda dar o testemunho da humildade, começando por si próprios, ou seja, desenvolvendo a capacidade de exame de consciência, a nível pessoal e comunitário, a fim de corrigirem nas suas atitudes aquilo que é anti-evangélico e desfigura o rosto de Cristo.” (RM 43)
Estrela da Evangelização
São Paulo VI, em sua Exortação apostólica Evangelli Nuntiandi, utiliza uma expressão muito bela ao se referir à Virgem: Estrela da Evangelização.
Quando lembramos da estrela que conduziu os Magos à gruta de Belém, logo nos remetemos à Virgem Maria, a estrela que nos guia, nos ensina, nos conduz ao Caminho, à Verdade e à Vida, Nosso Senhor Jesus Cristo. São Paulo VI assim nos fala na Evangelli Nuntiandi:
“Na manhã do Pentecostes, ela presidiu na prece ao iniciar-se da evangelização, sob a ação do Espírito Santo: que seja ela a estrela da evangelização sempre renovada, que a Igreja, obediente ao mandato do Senhor, deve promover e realizar, sobretudo nestes tempos difíceis, mas cheios de esperança!” (EN 82)
Nossa Senhora, como uma estrela que nos conduz, nos ensina com sua vida, seu testemunho, amor, ternura e serviço, como devemos ser verdadeiramente discípulos e missionários. Ela quem viveu sua missão de forma simples, e até mesmo no anonimato, nos revela que não precisamos de muito para viver nossa missão de maneira eficaz. Em primeiro lugar, nos abrindo ao chamado do Senhor, e em segundo, à ação do Espírito Santo. Papa Francisco, se utilizando do mesmo termo de “estrela da evangelização” ao se referir à Maria, nos apresenta esta bela palavra na Exortação Apostólica Evangelii Gaudium:
“Há um estilo mariano na atividade evangelizadora da Igreja. Porque sempre que olhamos para Maria, voltamos a acreditar na força revolucionária da ternura e do afeto. N’Ela, vemos que a humildade e a ternura não são virtudes dos fracos, mas dos fortes, que não precisam de maltratar os outros para se sentir importantes. Fixando-A, descobrimos que aquela que louvava a Deus porque “derrubou os poderosos de seus tronos” e “aos ricos despediu de mãos vazias” (Lc 1, 52.53) é mesma que assegura o aconchego de um lar à nossa busca de justiça.” (EG 288)
Como é bela esta expressão do Papa Francisco e que deve permear a nossa vida de missionários e evangelizadores: uma missão apoiada na força revolucionária da ternura e do afeto, a modelo da Virgem. Papa Francisco conclui:
“E é a mesma também que conserva cuidadosamente “todas estas coisas ponderando-as no seu coração” (Lc 2, 19). Maria sabe reconhecer os vestígios do Espírito de Deus tanto nos grandes acontecimentos como naqueles que parecem imperceptíveis. É contemplativa do mistério de Deus no mundo, na história e na vida diária de cada um e de todos. É a mulher orante e trabalhadora em Nazaré, mas é também nossa Senhora da prontidão, a que sai “às pressas” (Lc 1, 39) da sua povoação para ajudar os outros. Esta dinâmica de justiça e ternura, de contemplação e de caminho para os outros faz d’Ela um modelo eclesial para a evangelização.” (EG 288)
Louvemos ao Senhor pelo chamado amoroso do Senhor, de sermos discípulos e missionários. Sabemos bem que, pelas nossas forças, somos incapazes de corresponder a tão nobre missão, mas contamos com o auxílio e o modelo de vida de Nossa Mãe, Maria Santíssima. Que Ela nos ensine, nos conduza e nos ajude, com sua terna e amorosa intercessão. Amém.
Deus abençoe você.
Fontes:
BÍBLIA Sagrada CNBB. 10ª ed. São Paulo: Edições CNBB/ Editora Canção Nova, 2010.
FRANCISCO. Exortação apostólica Evangelii Gaudium – sobre o anúncio do Evangelho no mundo atual. Disponível em: <https://www.vatican.va/content/francesco/pt/apost_exhortations/documents/papa-francesco_esortazione-ap_20131124_evangelii-gaudium.html>.
JOÃO PAULO II. Carta encíclica Redemptoris Missio – sobre a validade permanente do mandato missionário. Disponível em: <https://www.vatican.va/content/john-paul-ii/pt/encyclicals/documents/hf_jp-ii_enc_07121990_redemptoris-missio.html>.
PAULO VI. Exortação apostólica Evangelii Nuntiandi – sobre a evangelização no mundo contemporâneo. Disponível em: <https://www.vatican.va/content/paul-vi/pt/apost_exhortations/documents/hf_p-vi_exh_19751208_evangelii-nuntiandi.html>.