“Meu filho estava morto e tornou a viver; estava perdido e foi reencontrado!”
O filho caçula abandonou o pai. Exigiu a parte que lhe cabia na herança e saiu pelo mundo a dissipar seus bens numa vida devassa. Enquanto isso, o outro filho, o mais velho, trazia o coração cheio de rancor. Fazia conta de cada serviço prestado ao pai, orgulhava-se de dizer que jamais havia transgredido um só dos seus mandamentos, mas reclamava de nunca ter recebido um cabrito sequer para festejar com seus amigos. Em suma, odiava o irmão mais novo e desprezava o próprio pai. Estava de olho apenas nas recompensas que esperava receber pelo trabalho. Esses filhos são, em certa medida, os filhos de cada pai que há no mundo. Alguns abandonam seu pai por um tempo, arrependem-se e voltam; outros o abandonam por toda a vida, mesmo que permaneçam morando sob o mesmo teto.
:: A Santa Missa é o nosso tesouro mais precioso
Queremos voltar o nosso olhar para o modo de agir do pai misericordioso, da tão conhecida parábola contada por Jesus. O filho mais novo ainda estava longe, retornando para casa, quando seu pai o viu. Não houve pedidos de explicação, não houve sermões nem castigos. Ele “encheu-se de compaixão, correu e lançou-se-lhe ao pescoço, cobrindo-o de beijos” (Lc 15, 20). Notemos que isso aconteceu antes mesmo de o filho pedir perdão. Logo em seguida, a preocupação do pai foi devolver a dignidade ao seu filho, que andava descalço, esfarrapado, sujo e fedorento. A melhor túnica, o anel, a sandália: “Meu filho estava morto e tornou a viver; estava perdido e foi reencontrado!”, celebra o pai. Vem o filho mais velho. Emburrado e cheio de ódio, vomita todo o seu rancor sobre o pai, que não se abala e tampouco condena o comportamento desprezível do primogênito: “Filho, tu estás sempre comigo, e tudo o que é meu é teu” (Lc 15, 31).
Na nossa luta para sermos bons pais, precisamos olhar para o Pai Misericordioso, para imitá-lo em seu amor incondicional, desinteressado, que tudo acolhe, tudo espera, tudo desculpa, tudo crê. Limitado e pecador como somos, contudo, faz-me bem lembrar que, antes de ser pai, somos também filhos, e quantas vezes fomos como o filho pródigo, que abandonou o pai, ou como o filho rancoroso, incapaz de olhar para o pai com amor. Ouso dar um passo adiante: talvez nós, pais, estejamos nos comportando como os filhos da parábola. De certa maneira, talvez tenhamos abandonado nossa missão, nossa responsabilidade como pais, seja vivendo para as coisas de fora, sem dar a atenção devida aos filhos, seja vivendo dentro de casa, mas com o coração distante, frio, amargo.
Perdão
Somente compreendendo essa realidade de sermos filhos pródigos que cada pai, para cumprir bem a missão tão exigente de educar, formar e sustentar seus filhos, poderá fazer a experiência do filho caçula da parábola: Ele, “tendo caído em si”, lembrou-se da fartura na casa paterna e decidiu voltar e pedir perdão ao seu pai. “Primeiramente, voltou-se para si e só assim pôde voltar para o pai”, nos explica Santo Agostinho. Ele mesmo, falando da sua própria vida, esclarece por que é necessário primeiro cair em si para que se possa voltar para Deus: “Durante os anos de minha juventude, pus meu coração em coisas exteriores que só faziam me afastar cada vez mais d’Aquele a Quem meu coração, sem saber, desejava… Eis que estavas dentro e eu fora!” O nosso coração, arrastado pelas coisas exteriores, apressa-se em afastar-se de Deus e, consequentemente, de nós mesmos.
Talvez o cair em si seja para você, pai, que hoje está preocupado demais com sua própria vida, com sua carreira profissional, seu salário, com o dinheiro ou com a falta dele, com as coisas que você quer fazer ou com as coisas que não quer fazer e por isso mesmo os seus filhos estão ocupando um lugar secundário em sua vida. Para você, quem sabe eles são apenas um número, uma soma da conta de escola a pagar no fim do mês, da roupa que precisa comprar, do presente, da comida. Talvez os filhos hoje sejam um inconveniente: não consigo mais viajar porque com os filhos tudo fica muito caro, não posso mais sair com a esposa todo final de semana porque tem os filhos para cuidar. O filho pródigo caiu em si, ou seja, percebeu que estava onde não deveria estar, que seu lugar não era aquele, junto dos porcos.
Gastar a vida
Para um pai, o que é cair em si? É compreender que os filhos não ocupam um lugar secundário em sua vida, não são uma soma de despesas e muito menos um inconveniente. O pai que cai em si está atento, vê o seu filho ainda de longe e corre ao seu encontro. Isso significa sacrificar-se por amor, ignorar o próprio bem-estar, o orgulho, a vontade, os caprichos. Significa gastar-se, gastar a vida, dizer para o filho não só com palavras, mas com a vida, que “tudo o que é meu é teu”. Um pai que cai em si não pensa a vida sozinho, não faz planos sozinho, rejubila-se em dizer ao filho: “Tu estás sempre comigo”, nos pensamentos, nos projetos, em qualquer circunstância.
Pai, talvez hoje seja o momento de você se reconciliar com a sua paternidade. Não há lugar para acusação, condenação, censura. Pelo contrário, é preciso que “festejemos e nos alegremos”, porque, como diz o Pai Misericordioso, “esse teu irmão estava morto e tornou a viver; ele estava perdido e foi reencontrado!”