MOTIVE-SE!

Encha-se de alegria!

O Espírito de Deus nos inspira e suscita atitudes missionárias

Vivemos numa sociedade pluralista, com convicções diferentes, práticas  religiosas, opções políticas e ideológicas tantas vezes contraditórias e provocantes.  Entretanto, a Igreja nos ensina a sonhar alto! Se este é um tempo cheio de desafios  e conflitos, não temos receio de buscar a “Jerusalém do Alto”. Voltemos os olhos e  o coração para o Apocalipse, no texto da Liturgia do Sexto Domingo da Páscoa: “Ele  falou comigo e disse: ‘Vem! Vou mostrar-te a noiva, a esposa do Cordeiro’. Então  me levou em espírito a uma montanha grande e alta. Mostrou-me a cidade santa,  Jerusalém, descendo do céu, de junto de Deus, brilhando com a glória de Deus. A  cidade não precisa de sol nem de lua que a iluminem, pois, a glória de Deus é a  sua luz e a sua lâmpada é o Cordeiro. As nações caminharão à sua luz e os reis da  terra levarão a ela a sua glória. Suas portas não precisam de ser fechadas cada dia,  pois já não haverá noite; e a ela serão levadas a glória e a riqueza das nações.  Nunca mais entrará nela o que é impuro, nem alguém que pratique a abominação  e a mentira. Entrarão nela somente os que estão inscritos no livro da vida do  Cordeiro” (Ap 21,10-11.23-27). 

“Deixo-vos  a paz” | Foto ilusrativa: cancaonova.com

Como poderemos contribuir para que a Jerusalém do Alto penetre as  estruturas do mundo atual? Não nos cabe ser profetas da destruição e ameaças  diante de tantos problemas. Os cristãos, com as convicções nascidas do Evangelho,  hão de ser homens e mulheres anunciadores, com a palavra e a vida, da novidade  que só pode vir de Deus. Há uma promessa de Jesus que ressoará nas próximas  semanas em nossos ouvidos, devendo encontrar a resposta adequada de nossa fé.  Trata-se da certeza de que não estamos sozinhos, pois o Espírito Santo foi  derramado em nossos corações. Ele é chamado Consolador, Defensor, Advogado!  Com tal companhia, poderemos assumir os desafios que a vida apresenta, dando resposta corajosa e firme, comprometendo-nos com a força do Evangelho e  tornando-nos efetivamente evangelizadores, cada um na sua vocação e com os seus  dons. 

O Espírito de Deus nos inspira e suscita atitudes missionárias.

Tomemos  consciência de que as portas da cidade querida por Deus devem estar abertas. A  primeira delas é a porta da misericórdia e do perdão. Há muitas pessoas sedentas  de acolhimento, marcadas pela rejeição, traumatizadas por situações pessoais e  sociais, com um histórico familiar tantas vezes doloroso! E muitas delas não  descobrem a porta da Igreja, a não ser através do testemunho, muitas vezes  silencioso, de cristãos que olham ao seu redor e não se omitem, mas fazem o bem,  sem desviar o olhar, as mãos e o coração. Este olhar deverá ter a coragem da  preferência pelos mais sofredores e isolados, aquelas pessoas que muitas vezes  nem têm a coragem ou possibilidade de reclamar.

A elas e a todas as outras se estende a promessa feita por Jesus: “Deixo-vos  a paz”! Só que não é a paz da defesa ou do preparar-se para guerrear. O medo é  vencido quando, deixando-nos conduzir pelo Espírito Santo, professamos a fé no  amor de Deus que nos conduz. E esta paz há de nascer dentro de nós, de uma  consciência pura e aberta para Deus, em cuja força poderemos viver sem medo  nem perturbações. Entretanto, o próprio Senhor nos alerta que no mundo teremos  perturbações. A verdadeira paz vem das chagas abertas do Crucificado Ressuscitado, que se manifesta aos discípulos no dia glorioso da Páscoa. Tomar  consciência das dores, perseguições ou fraquezas eventualmente existentes em  nossa vida deverá levar-nos à certeza de que “se à tarde vem o pranto visitar-nos,  de manhã nos vem saudar a alegria” (Sl 29,6). Nossa vida é toda pascal, passagem  da morte para a vida, da tristeza para a alegria, das trevas à luz, do pecado à graça! 

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A alegria prometida é diferente e supera a exuberância de risadas ou festas.  Impressiona muito passar pelas nossas ruas, quase que a qualquer hora, e ver  pessoas em torno de mesas nas calçadas a beber! E se olhamos bem em seus olhos,  muito além da pretensa exuberância vinda da bebida, é possível identificar uma  tristeza profunda! A alegria que vem de Deus é muito maior! Sabemos, com São  Paulo, que a alegria é fruto do Espírito Santo e não fruto da carne! Nossas cidades  poderão readquirir a alegria se nos empenharmos em relações verdadeiras e  sinceras, quase “costuradas” pouco a pouco, no contato que pudermos estabelecer.  Quem sabe será válida a proposta de cultivar, em marcação cerrada, alguma  pessoa a quem possamos manifestar o bem querer! Pode ser uma visita, uma  mensagem, uma chamada telefônica, para chegar a um diálogo verdadeiro e  sincero! A imagem do cacho de uva é sugestiva. Se cada um de nós cultivar no  amor cristão uma ou mais pessoas, poderemos incendiar com o amor de Deus  nossas cidades e ambientes! 

“Fazei o que ele vos disser” (Jo 2,5).

Os Atos dos Apóstolos (At 15,1-29) contam a primeira reunião, que muitos chamaram de Concílio de Jerusalém, quando foram capazes de enfrentar as  dificuldades surgidas nas primeiras comunidades cristãs, ouvindo uns aos outros,  superando eventuais preferências pessoais, para chegarem a exigir delas aquilo  que é essencial, sem fazer pesar àqueles que vinham de longe eventuais normas  herdadas do judaísmo. Também nós, nas cidades de hoje, em nossa Igreja,  precisamos aprender que o caminho percorrido pelas pessoas tem diferenças e  graus a serem respeitados e valorizados. A paciência com os defeitos dos outros  suscitará neles mesmos a mesma atitude conosco, já que pecadores todos somos!  A reciprocidade do amor misericordioso será fonte de alegria! E abrir-se-ão outras  portas como o diálogo, o serviço, o testemunho de comunhão e o anúncio e  pregação explícita do Evangelho. 

Enfim, parece-nos oportuno recordar neste mês de maio aquela que é  chamada na Ladainha de “Causa de nossa alegria”, a Virgem Maria, que neste ano  a preparação do Círio de Nazaré chama de “Mãe e Mestra”, aquela que de braços  abertos levou seu Filho menino ao templo. Em Nazaré, com as portas abertas de  sua casa e sua família, guardou tudo no coração, abraçou a vida cotidiana com  serenidade, fez-se discípula de seu próprio Filho, tanto que em Caná provocou o  milagre da alegria. Com ela, poderemos trazer a alegria para nossas cidades, com  a receita de milagre: “Fazei o que ele vos disser” (Jo 2,5).

DOM ALBERTO TAVEIRA CORRÊA
Arcebispo Metropolitano de Belém do Pará

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