REFLITA

Ninguém sabe o que Deus faria de nós, se não opuséssemos tantos obstáculos à sua graça

“Se Deus não tivesse me resgatado da situação em que eu me encontrava, sabe-se lá onde eu estaria hoje. Talvez, nem estivesse vivo…”

“Deus me tirou de um buraco, do fundo do poço. Eu estaria nas trevas da morte, se não tivesse tido o meu encontro pessoal com Cristo…”

Volta e meia ouvimos frases como essas no meio religioso, seja uma pregação, um testemunho ou mesmo uma partilha entre amigos. É o desejo transbordante de mostrar quanto bem fez à alma da pessoa o encontro salvífico com Cristo. Muito mais raras, contudo, ainda que sejam bem mais benéficas à alma, são reflexões do tipo:

“Ando com Cristo já há tanto tempo… A essa altura, percebi que se meu coração não fosse tão duro, eu deveria ser muito mais capaz de amar o meu próximo. Entretanto, ainda sou tão impaciente, vingativo, preconceituoso…”

“A vontade de Deus é revelada onde há um coração vazio, no qual ela possa ser acolhida, isto é, num coração pobre”. | Foto ilustrativa:

 

“Deus já fez tanto por mim, já operou tantos milagres na minha vida! Mesmo assim, quanto deixei de crescer espiritualmente por conta dos muitos obstáculos que sempre coloquei, impedindo que a graça de Deus me alcançasse e me convertesse…”

Sim, sem dúvida alguma devemos ter um coração agradecido a Deus, louvá-lo pelo bem que Ele nos fez, mas não podemos jamais perder de vista que “a bondade do Senhor é sem fim, misericórdia que não se acaba, fidelidade que se renova hoje e sempre” (Lm 3,22). Se a bondade de Deus é sem fim e nós somos limitados, das mais variadas formas nós desperdiçamos a graça inesgotável de Deus, ignorando, desprezando-a, rejeitando-a.

O Monsenhor Jonas Abib nos ensina que “somente num coração totalmente despojado é que Deus pode fazer morada – foi numa gruta vazia que Ele nasceu”. Diante disso, devemos nos perguntar se em algum momento da nossa vida o nosso coração esteve totalmente despojado. Se até hoje meu coração guarda apegos a pessoas, sentimentos e coisas, ou seja, não é exclusivo de Deus, então por mais que eu tenha mudado, transformado a minha vida, ainda não cheguei à plenitude do que Deus quer pra mim, ainda não sou o homem novo que preciso ser, pois, nos ensina novamente o Monsenhor, “a vontade de Deus é revelada onde há um coração vazio, no qual ela possa ser acolhida, isto é, num coração pobre”.

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Que apegos ainda sobrevivem no seu coração? Se for o egoísmo, que comumente traz à tona o homem velho, pergunte a Deus:

“Senhor, onde eu estaria se eu não fosse tão egoísta?”

Se é o medo, pergunte:

“Meu Deus, o que eu estaria fazendo pelo Reino de Deus, pela evangelização, se eu não fosse tão medroso?”

Se você ainda é apegado ao que os outros pensam de você, pergunte a Deus:

“Jesus, o que vós teríeis feito de mim se eu não fosse tão vaidoso, se eu só olhasse para vós, só ouvisse a vossa voz a me chamar, sem me importar com o que os outros dizem ou pensam?”

Percebe como é possível continuar essa reflexão por muito tempo? É que o seguimento de Jesus é exigente: “Se alguém quer vir após mim, renuncie a si mesmo, tome sua cruz e siga-me”, diz o Senhor (Mt 16,24). Renunciar a si mesmo começa pela renúncia ao pecado, mas este é só o primeiro passo. Se você se acomodar a isso, vai acabar vivendo numa perigosíssima ilusão: a de que você já fez muito por Deus ao abandonar este ou aquele pecado. Por que é uma ilusão tão perigosa? Porque ignora que o chamado de Cristo não é apenas para abandonar o pecado. O jovem rico já tinha feito tudo isso e saiu entristecido da presença de Cristo, que o convidou a viver a radicalidade do amor. Só quem renuncia a si mesmo, não somente ao pecado, torna-se apto a tomar a sua cruz e seguir Jesus.

Examinando a nossa vida, precisamos nos perguntar com toda sinceridade onde estaríamos se não colocássemos tantos obstáculos à graça de Deus. Quanto amor seríamos capazes de dar aos nossos irmãos! De quanta paciência estaríamos revestidos, como seríamos generosos com Deus, justos nos nossos relacionamentos, prudentes em nossas decisões! Em suma, se não fôssemos tão resistentes ao Espírito Santo, como seríamos parecidos com Cristo!

Contudo, não desanimemos com as nossas respostas. Lembremo-nos dos operários da última hora. Enquanto tivermos vida, temos a oportunidade de nos decidir por Cristo. Como fazer isso? Renuncie a si mesmo, abrace a sua cruz e siga Nosso Senhor. Esvazie o seu coração e permita assim que a vontade de Deus nele se revele e seja, portanto, acolhida.

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