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Igreja celebra hoje Solenidade de São João Batista

Hoje, dia 24 de junho, celebramos a Solenidade do nascimento de São João Batista. Ele mesmo se identificou como a “voz que clama no deserto” (Jo 1,23). Menino que, antes de nascer, já é designado, e revela-se de quem seria o precursor antes de ser visto por ele. Aquele que representa o Antigo Testamento e anuncia o Novo. Representa o Antigo Testamento, nasce de pais idosos; e porque anuncia o Novo Testamento, é declarado profeta ainda estando nas entranhas da mãe. Tudo isso são coisas divinas, que ultrapassam a limitação humana. É com base no sermão de Santo Agostinho – século V – (Sermão 293,1-3: PL38, 1327-1328) que iniciamos esta breve meditação sobre a vida deste profeta. 

Muito mais que festejos juninos, São João Batista nos aponta uma realidade mais profunda, a mais nobre, que perpassa os séculos: Jesus Cristo é o Messias! Em uma das de suas Audiências Gerais (29 de agosto de 2012), Bento XVI, com maestria, fazia-nos aprofundar ainda mais, pois o profeta não se limitava a pregar a penitência e a conversão, mas, reconhecendo Jesus como “o Cordeiro de Deus” que veio para tirar o pecado do mundo (cf. Jo 1, 29), tem a profunda humildade de mostrar em Jesus o verdadeiro Enviado de Deus, pondo-se de lado a fim de que Jesus possa crescer, ser ouvido e seguido. Como último gesto, João Batista testemunha com o sangue a sua fidelidade aos mandamentos de Deus, sem ceder nem desistir, cumprindo a sua missão até ao fim.

São Beda, monge do século IX, nas suas homilias: “São João, por (Cristo) deu a sua vida; embora não lhe tenha sido imposto que negasse Jesus Cristo, só lhe foi imposto que não dissesse a verdade” (cf. Hom. 23: ccl 122, 354). E ele dizia a verdade, e assim morreu por Cristo, que é a Verdade. Precisamente pelo amor à Verdade, não cedeu a compromissos nem teve medo de dirigir palavras fortes a quantos tinham perdido o caminho de Deus.

Foto ilustrativa: São João batista batizando Jesus/ Crédito: sedmak

Diante da vida de São João Batista, somos incomodados com sua fidelidade, com seu caráter firme de dizer e viver a verdade até o fim, uma vez que nossa sociedade apregoa, em todos os lugares, de maneira sutil ou escandalosa, que as nossas relações com as pessoas e com as coisas equivalem a mesma coisa.

Somos seduzidos facilmente pelas distrações do mundo, pelas pompas demoníacas em formas de ideologia, pelo relativismo desenfreado, e acabamos como Herodes Antipas, que mesmo não odiando São João Batista, foi seduzido pela filha de Herodíades, Salomé; e acabou por aprisionar João na fortaleza de Maqueronte, atual Jordânia. E depois mandou degolá-lo. Herodes estava com a consciência anestesiada como disse o Papa Francisco: 

Perante os «remorsos da consciência», alguns procuram eliminá-los, escondê-los e até «anestesiá-los», cobrindo-os com outras culpas. Mas para «sarar» as «chagas do coração e da alma» é preciso «revelar a verdade» e ter «a sabedoria de se acusar a si mesmo», explicou o Papa falando da experiência negativa de Herodes Antipas para sugerir a cada cristão a relação correta com a própria consciência. Como se lê no Evangelho de Lucas (9, 7-9), o tetrarca Herodes ouvia falar do que Jesus fazia, mas «não sabia o que pensar». Sentia-se confuso, porque alguns diziam que Jesus era Elias ou outro profeta ressuscitado, e outros pensavam em João Batista. E ele «procurava vê-lo». Mas a de Herodes «não era simples curiosidade». O seu problema «era algo que sentia dentro: um remorso na alma, no coração». Intui-se isto claramente quando diz: «Não, não é João, porque o mandei decapitar». Ou seja, revela um «crime que cometera». Herodes «carregava» dentro de si essa culpa e «procurava ver Jesus para se tranquilizar, sentia remorso». (MEDITAÇÕES MATUTINAS NA SANTA MISSA CELEBRADA NA CAPELA DA CASA SANTA MARTA, Quando se anestesia a consciência, 2017).

 

São João Batista identificava-se como o “Amigo do Esposo”: “Quem tem a esposa é o esposo; e o amigo do esposo, que o acompanha e escuta, sente muita alegria ao ouvir a sua voz. Essa é a minha alegria, que agora é completa: Ele deve crescer e eu diminuir” (João 3,29-30). As palavras de São João Batista são claras e profundamente nos interpela a viver uma vida virtuosa e próxima do Esposo, Jesus Cristo.

O Catecismo da Igreja Católica (§796) nos ensina:

 A unidade de Cristo e da Igreja, Cabeça e membros do Corpo, implica também a distinção entre ambos, numa relação pessoal. Este aspecto é, muitas vezes, expresso pela imagem do esposo e da esposa. O tema de Cristo Esposo da Igreja foi preparado pelos profetas e anunciado por João Baptista (Jo 3, 29). O próprio Senhor Se designou como «o Esposo» (Mc 2, 19) (Mt 22, 1-14; 25, 1-13). E o Apóstolo apresenta a Igreja e cada fiel, membro do seu Corpo, como uma esposa «desposada» com Cristo Senhor, para formar com Ele um só Espírito (1 Cor 6, 15-17; 2 Cor 11, 2). Ela é a Esposa imaculada do Cordeiro imaculado (Ap 22. 17; Ef  1, 4: 5, 27) que Cristo amou, pela qual Se entregou «para a santificar» (Ef 5, 26), que associou a Si por uma aliança eterna, e à qual não cessa de prestar cuidados como ao Seu próprio Corpo (Ef  5, 29).

E acrescenta Santo Agostinho no mesmo parágrafo:

“Eis o Cristo total, Cabeça e Corpo, um só, formado de muitos […]. Quer seja a Cabeça que fale, quer sejam os membros, é Cristo que fala: fala desempenhando o papel de Cabeça (ex persona capitis), ou, então, desempenhando o papel do Corpo (ex persona corporis). Conforme ao que está escrito: «Serão os dois uma só carne. É esse um grande mistério; digo-o em relação a Cristo e à Igreja» (Ef 5, 31-32). E o próprio Senhor diz no Evangelho: «Já não são dois, mas uma só carne” (Mt 19, 6). Como vedes, temos, de algum modo, duas pessoas diferentes; no entanto, tornam-se uma só na união esponsal […] «Diz-se “Esposo” enquanto Cabeça e “esposa” enquanto Corpo»
(Santo Agostinho, Enarratio in Psalmum 74, 4: CCL 39, 1207 (PL 37, 948-949).

Creio que você percebeu que, biblicamente, assim como em sua vida, São João Batista não apareceu em muitos versículos. Mas com humildade preparou o caminho para o Senhor. Jesus fez grandes elogios a João: “Em verdade vos digo: entre os filhos das mulheres, não surgiu outro maior que João Batista. No entanto, o menor no Reino dos céus é maior do que ele. Desde a época de João Batista até o presente, o Reino dos céus é arrebatado à força e são os violentos que o conquistam” (Mateus 11, 11-12). E ainda, “Vós enviastes mensageiros a João, e ele deu testemunho da verdade. João era uma lâmpada que arde e ilumina; vós, porém, só por uma hora quisestes alegrar-vos com a sua luz” (Jo 5, 35). Jesus, já sabemos, dizia verdades eternas e quando elogiava mostrava a pureza da verdade, bem como quando exortava ou ensinava. Ele é a Verdade

Nós, que estamos no caminho de perfeição, que buscamos a Deus e nos esforçamos junto a sua Graça, para crescer a cada dia na união com Cristo, vemos que São João Batista é um grande modelo de imitação se nos esmerarmos em buscar a humildade, virtude tão excelente, ou espelharmos um pouco a vida deste profeta: fazendo penitência pela nossa conversão e de nossa família; ou ainda, nos dedicarmos a viver mais assiduamente a Verdade Revelada por Jesus Cristo e anunciar, com o nosso testemunho, ou sermos obedientes, simples e cheios do Espírito Santo. Veja quantas virtudes podemos compreender da vida deste grande profeta, que nos ensinou tanto em pouquíssimas aparições bíblicas. 

Em suma, concluímos com as palavras de Santo Agostinho: João é a voz no tempo; Cristo é, desde o princípio, a Palavra eterna (Sermão 293,1-3: PL 38,1327-1328).  Peçamos ao Espírito Santo que nos conduza ao caminho reto, que aplaine os caminhos para que estejamos mais unidos a Jesus. Que nos dê forças para dominar a carne, renunciar “danças” sedutoras do mundo e nos ajude a vencer a nós mesmos. Todos nós estamos num caminho de retorno a Deus, creio que você já tenha se dado conta disso. Que a cada minuto que passa, nossa vida se esvai, e assim estamos mais perto daquele que nos criou naturalmente. Então, não perca mais tempo, volte para Deus!

Que São João Batista interceda por nós!

Guilherme Razuk
Seminarista Comunidade Canção Nova

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