ADORAÇÃO EUCARÍSTICA

Se vos possuo, nada mais me atrai!

A contemplação eucarística não é, absolutamente, algo estético e inoperante

O título deste texto pode ser interpretado de várias formas, algumas positivas e outras negativas. No Salmo 73 (72), o autor sagrado, após refletir sobre o aparente sucesso daqueles que não obedecem às leis de Deus e que praticam o mal, termina por reconhecer que apenas uma coisa lhe é necessária: Deus. Em um movimento de reconhecimento por ter experimentado tão grande alegria, ele exclama no versículo 25: Afora vós, o que há para mim no céu? Se vos possuo, nada mais me atrai na terra. O objetivo do autor sagrado é expressar seu amor por Deus e o seu desejo em estar e permanecer na presença do Altíssimo.

Santuário do Pai das Misericórdias| Foto: Wesley almeida/ Arte: Agência Arcanjo

A frase “Se vos possuo, nada mais me atrai” deve ser pensada dentro desta dimensão de um encontro que preenche o ser por inteiro, alicerçada na experiência com o amor e a misericórdia de Deus em um encontro que se sobressai sobre todas as demais experiências e paixões humanas. Portanto, a expressão “nada mais me atrai” não deve ser entendida como um desprezo do “mundo” ou de tudo que é material. Ela não é uma atualização ou apologia à heresia do gnosticismo dos primeiros séculos da história da Igreja, onde o homem deveria desprezar e abandonar tudo aquilo que é matéria, pois tudo que é material é mau e imperfeito, pois foi criado por um demiurgo.

O verbo possuir pode ser utilizado com significados e contextos diferentes. No dicionário, muito provavelmente, a primeira definição encontrada estará relacionada à propriedade, ao ato de ter algo. Porém, existem outras definições que se aproximam mais do sentido e da proposta deste texto, como por exemplo: trazer consigo as características de; deixar-se dominar por e tornar- se convicto de.

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Quando pensado desta maneira, é possível entender que o ato de possuir a Deus é, na verdade, afeiçoar-se com suas características, permitir a Ele o domínio e ter a convicção de que com Ele tudo ganha sentido.

São Paulo é um testemunho concreto dessas três definições. Quando ele escreve à comunidade que se encontra em Filipos, no terceiro capítulo ele declara:

Mas essas coisas, que eram ganhos para mim, considerei-as prejuízo por causa de Cristo. Mais que isso, julgo que tudo é prejuízo diante deste bem supremo que é o conhecimento do Cristo Jesus, meu Senhor. Por causa dele, perdi tudo e considero tudo como lixo, a fim de ganhar Cristo. (Fl 3,7-8)

O Encontro

São Paulo viveu a experiência de um encontro que o fez mudar sua forma de ver e pensar a existência de tudo e de todos. Ele se tornou convicto que somente Cristo é aquele capaz de dar pleno sentido à vida. São Paulo deixou-se ser moldado, conduzido, dominado por Jesus e passou a trazer na sua própria vida características d’Aquele que o amou. Como Ele mesmo expressou: Já não sou eu que vivo é Cristo que vive em mim ( cf. Gl 2,20).

A verdade é que ninguém que se encontra com Cristo permanece o mesmo. O amor de Jesus dá novo sentido à vida, ilumina caminhos até então desconhecidos e escuros. O amor de Jesus mostra um novo horizonte. Quem possui Cristo não volta pelo mesmo caminho.

Dom Henrique Soares da Costa gostava de afirmar: “O cristianismo não nasce de uma teoria, ser cristão não é seguir uma filosofia de vida, é encontrar-se com Jesus e ter sido encontrado por Ele”. É deixar-se possuir por Cristo sendo, ao mesmo tempo, possuído por Ele.

Por graça e amor divino, nós temos a oportunidade de nos colocar diante de Jesus na Adoração Eucarística. É possível, através da adoração ao Santíssimo Sacramento, atualizar constantemente este encontro entre eu e Jesus. São Pedro Julião Eymard, ao comentar sobre a adoração, diz que devemos olhar para o tempo que passamos na adoração como um tempo passado no paraíso. Devemos ir para a adoração como alguém que vai ao banquete do Reino dos Céus, pois assim o tempo diante de Jesus será um tempo desejado, de salvação e de alegria. E o santo aconselha que, antes de ir ao encontro de Jesus na adoração, devo ir me provocando ao longo do dia, deixando-me ser consumido pelo futuro encontro. São Pedro Julião diz: “Daqui quatro horas, daqui duas horas, em uma hora, eu terei um encontro de graça e de amor com Nosso Senhor: Ele me convidou, Ele me espera e Ele me deseja (tradução livre)

O Cardeal Raniero Cantalamessa afirma:

A contemplação eucarística não é, absolutamente, algo estético e inoperante. O ser humano reflete em si, às vezes até fisicamente, aquilo que contempla. É verdadeira também, em sentido cristão, a intuição do filósofo Plotino: “Cada ser é aquilo que ele contempla”.

Portanto, se faz necessário buscar e criar espaços para o Cristo na adoração. É sair desta relação tendo Ele como uma posse. É poder confirmar na própria vida o que São Paulo afirmou: Por ele eu perdi tudo, para ser achado Nele. É ter a certeza que, ao sair de mim, do meu jeito de ser e ver as coisas, eu possuirei o jeito de Cristo. É experimentar que só me encontro a mim quando eu me encontro n’Ele. É poder dizer como Santa Teresa D’Ávila: Quem a Deus tem, nada lhe falta, só Deus basta.

Deus o abençoe!

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